Dois sonhos de fim do mundo

Vez ou outra, sonho com o fim do mundo, o que vem muito a calhar com a nossa época. Em um desses sonhos, o apocalipse era consequência de um fenômeno estranhíssimo em nossa atmosfera, a qual adquiria as cores mais absurdas e lentamente deixava de ser respirável. A ciência não fazia a menor ideia do que estava causando aquilo e, assim sendo, nada podia fazer para evitar o colapso do nosso ar. Havia, no entanto, uma saída para a humanidade: voar por cima da atmosfera.

E era isso que tentávamos fazer, voar, flutuar ou simplesmente nos deixar subir até a altura que já fosse possível respirar normalmente. A tentativa, no entanto, não dava muito certo, porque trombávamos nas várias construções existentes e elas nos mantinham aqui embaixo – no ar irrespirável.

Em algum momento, sobreveio a certeza: nós todos iríamos morrer. E, embora em muitos isso só provocasse desespero, em mim havia uma profunda paz – ouso dizer que era praticamente uma alegria. Sim, eu iria morrer, mas tudo estava bem e da forma que havia de ser. Apenas tratei de encontrar os meus pais e dizer para eles que eu os amava e todas as coisas que ainda não havia tido tempo ou coragem para dizer. Ouvi coisas semelhantes em resposta e vi que tudo isso era bom e que convinha a mim.

Estávamos todos unidos nesse momento – no momento da nossa morte! –, com um sentimento forte de um para o outro, com muita disposição para compreender e para ajudar (era como se soprassem em nossos ouvidos “sim, sim, ajudar!”). Era bonito o momento em que aguardávamos o fim do mundo.

Mas, de repente, os que detinham poderes de acabar com o mundo se apresentaram diante de nós e revelaram que não iria haver fim do mundo coisa nenhuma – e, imediatamente, a atmosfera voltou ao normal. Parece que era uma espécie de brincadeira, uma “pegadinha” mesmo, como se quisessem com isso nos ensinar alguma lição. Perguntei-me se tudo aquilo valia a pena, porque alguns, no desespero que havia tomado conta do início, haviam se suicidado. Não tive resposta, mas intuí que ainda valia a pena.

***

Em outro sonho, eu estava entre um grupo de pessoas que sabia que iria morrer e, por isso, apenas fechamos os olhos e esperamos. A morte demorou um pouco para chegar, mas veio como um “clique” e nos transportou para outro lugar. Estávamos então em um veículo de transporte, sem saber para onde estavam nos levando. Não havia lugar para todos e muitos corriam atrás do veículo tentando alcançá-lo.

Entendi que aquilo devia ser algum desafio. Depois de um tempo, dei-me conta do que precisaria fazer: “Vou oferecer lugar aos outros”. Enquanto cada um brigava por si, chamei as pessoas para irem comigo. E me senti orgulhoso por agir assim, mas achei que também não convinha me orgulhar de mim mesmo.

E de repente vivíamos um tipo de vida, muito parecida com a nossa. Fazíamos até piadas. Lembrei-me de uma porção de coisas da Terra, esse mundo que, pelo menos para nós, havia acabado. Notei que por ali ninguém estava usando máscaras, o que me fez perguntar: “Será que a pandemia já acabou?”.

Subitamente, vi surgir vários idosos. Falei para alguém ao meu lado: “Ai, meu Deus, estão trazendo os avós das pessoas!”. Vi o meu avô, esperei que ele viesse até mim, mas fui arrastado até ele, por mãos desconhecidas. Meu avô me abraçou, falou palavras afetuosas e disse que seria meu melhor amigo “aqui em casa”. Em seguida, ele me mostrou alguma coisa sobre pesquisas históricas, pois isso era o que nos unia na época em que a Terra ainda existia. Adorei saber que podia continuar pesquisando por ali. Nós ficamos conversando um bom tempo e, quando fui perguntar sobre a minha avó e sobre outras pessoas que moravam na “casa”, acordei – na Terra mesmo.

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 23/05/2021
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