NO TRÂNSITO SELVAGEM

Normalmente a rotina tem sido essa: de casa pro trabalho e do trabalho pra casa. Sem dúvidas, a pandemia tem atrapalhado as resenhas de fim de expediente com a galera e tornado os aplicativos de mensagens instantâneas o principal ponto de interação que confesso não ter a mesma graça. Entretanto, essa análise fica pra um outro momento, porque o assunto de agora acontece quando chego em casa, desço do veículo e no tempo livre que tenho durante o banho, vejo a minha cabeça involuntariamente criar um roteiro ao melhor estilo Animal Planet para a vida no trânsito.

Dentro desse contexto, os carros não são como as lanchas, nem as motos são como os jetskys, já que não estamos no mar. A cidade é uma enorme floresta que ao invés de plantas normais, nos oferecem árvores de concretos que tendem a ficar cada vez maiores e irem cada vez mais longe. O que no final das contas não faz tanta diferença já que percorrer essas trilhas é uma atividade equiparável a fazer rally na superfície da Lua. Quanto à classificação, podemos atribuir que o porte de cada veículo corresponde à uma espécie: Os caminhões são elefantes poderosos que andam por suas próprias trilhas em manadas e que outras criaturas não ousam encarar (até mesmo porque não vão ganhar mesmo); As picapes podem ser equiparadas a leões e tigres, felinos poderosos que tem a fama de dominar o topo da cadeia alimentar da vida selvagem; Há ainda a figura do guepardo, um dos animais mais rápidos do reino animal que serve de representante para o veículo mais veloz já criado pela humanidade, o lendário Uno da firma com uma escada em cima. As motos por sua vez, são animais menores, perdendo a batalha para esses outros animais. As motos tunadas (aquelas que parecem de corrida) São como os leopardos, rápidos, precisos e que demanda muito custo pra manter (assim como você gastaria com carne se precisasse alimentar um leopardo), as de meio porte, são como os búfalos, que dificilmente entram em brigas, mas mesmo perdendo ainda tenta atacar, e por fim, as de pequeno porte (que muita gente fala que nem moto é), são como as zebras e os servos.

Nós, simples pessoas, acabamos nos tornando a consciência do animal que temos. Se estamos em um caminhão, somos elefantes; se estamos em uma picape, somos leões; em uma moto, somos leopardos. Entretanto, independente de qual veículo você esteja, se você não ligar a (palavra censurada pela Organização Nacional da Erradicação dos Palavrões – ONEP) da seta, automaticamente será convertido em uma anta ou jumento. O mesmo processo é válido para não respeitar a placa de pare, furar o sinal vermelho, e principalmente o de ultrapassar pela direita (salvo certos casos). Por fim, quando estamos sem transporte, somos apenas suricatos que podem ir livres, já que as presas tem alvos maiores.

Embora eu desconheça a sensação de ser um elefante, ou leão, começo a evoluir de um simples suricato para um búfalo apenas para descobrir que a vida na selva é osso. Dividir o caminho com as feras é algo que assusta no começo, mas depois… Bem, eu ainda guardo expectativas, ansioso pra conhecer esse “depois” porque agora ainda estou no começo (eu diria que na verdade no prólogo do começo). As vezes o nervosismo faz com que meu búfalo tenha narcolepsia e simplesmente apague em um cruzamento ou numa vaga de estacionamento qualquer, o que tem me feito exceder minha franquia de “passar vergonha” diária (mas já entrei em contato com a operadora para comprar um pacote maior).

Por fim, fica o apelo para que todos sejam mais atenciosos no trânsito, porque cada pessoa é uma criatura única e em risco de extinção para a família e os amigos. Toda vida merece ser preservada e assim o equilíbrio desse ecossistema será mantido. E antes que eu esqueça, se virem um búfalo com uma jaqueta escrita “aluno recém-habilitado”, melhor não arriscar a prova, ele realmente deve estar falando sério acerca do seu desastre em potencial...