Feliz Idade

Um dia desses estava diante do espelho e comparando com alguns anos atrás... nossa, que diferença! Dá até pra sentir um frio no estômago só de pensar como estará meu reflexo em uma década! Só quando se chega nela é que se sabe, que angústias e incertezas trazemos dentro do coração, uma vez que vivemos em uma sociedade que só valoriza o novo, o belo. É pra dar nó em qualquer cabeça, afinal, todo mundo vai ficar velho um dia; mas quando se é jovem, parece que a meia-iade e a velhice simplesmente não existem, são completamente deletadas do sistema e só se tem notícia dela com a presença constante dos pais, tios e avós. Parece que o mundo todo conspira contra você, suas rugas são motivo de desespero, pois elas estão ali justamente pra te denunciar a idade, impossível de aguentar! As pálpebras caem e você fica com aquela aparência de tia-avó, pesadelo completo! Agora é o jeito: cirurgia plástica é a solução; não é à toa que o Brasil é o segundo lugar no ranking. Idade: 50, cara de 30 e comportamento de 20. É isso mesmo que buscamos? Não te parece um pouco estranho tudo isso? Acho que está na hora de ajustar o foco, porque ele está , com certeza, distorcido.

Vamos parar um pouquinho para analisar: por que queremos parecer mais jovem? Por que ludibriar as pessoas, aparentando o que não temos?

A idade não é um peso, é um reflexo da experiência, da maturidade; aquilo que conquistamos exatamente com ela. Se já percorremos determinado caminho, é sinal que já alcançamos a compreensão de que a vida é efêmera, de que não seremos adolescentes para o resto da vida, de que teremos de enfrentar perdas ao longo dela. As marcas que a idade nos desenha no rosto não é motivo de desespero, muito pelo contrário, motivo de serenidade. É a prova irrefutável de que muito já foi vivido e muito aprendido. E é essa lucidez que agora possuímos, não foi uma dádiva das doces ilusões da juventude; foi, sim, uma conquista mais do que merecida por tantas noites mal dormidas, por tantas lágrimas derramadas, por tantas angústias sufocadas. E aqui estamos, prontinhos para cada nova batalha, que certamente irá colorir ainda mais o nosso caminho restante.

Pra quê, então, aquele frescor da juventude se podemos tão mais com a maturidade? Pra quê um lindo par de pernas se nosso poder de sedução vai muito além da simples aparência? Não se conquista um amor com sorrisos e uma cintura fina; conquista-se, sim, com equilíbrio, com essência. A lucidez é o maior bem que o tempo pode nos conceder, afinal , é ela que regula os nossos passos e coloca no chão os nosso pés. Bendita seja a santa lucidez dos 30, dos 40, dos 50 e de cada nova década! É ela que confere à transparência necessária de que precisamos para enxergar cada nova etapa da vida. Ela pode tirar o colorido e colocar a tela em preto e branco, mas os clássicos tão amados do cinema foram feitos em preto e branco. E não adianta colorizar por computador que estraga tudo. Assim é a vida, assim somos nós; assim devemos aceitar, afinal, nem tudo é mesmo um mar de rosas. E desse mar que não é de rosas, devemos extrair o perfume para que dele não venham ondas mais turbulentas no futuro. Tsunami hoje não é palavra que só existe em livro de geografia, agora é realidade de telejornal; realidade de vidas. E para que tudo seja uma eterna calmaria devemos nos olhar no espelho e agradecer por cada mudança, por cada linha traçada, pois elas são a prova viva de que você pode ter se tornado um ser humano bem mais interessante, bem melhor do que há algumas décadas atrás. Feliz seja a idade, porque a chave da felicidade está escondida nela, a nossa tarefa é encontrá-la.