“Oba!”

Usei inda agora uma espécie bastante singela de cumprimento que escutei muitas e muitas vezes da boca desdentada, mas também demasiadamente sincera, do meu avô paterno. Digo "desdentada", entanto, a verdade é que ele usava dentes postiços na maior parte do tempo. E digo “demasiadamente sincera”, porque o velhinho desandava, de quando em quando, a tagarelar o “mal” de quem lhe desagradasse no jeito de andar, cantar, trabalhar e até, acredite, orar (é verdade, meu avô por parte de pai era um ranzinza).

Ainda me lembro – nostalgia em alta, hein! – de sair com meu avô caminhando pelas ruas da Brasilândia; eu, moleque que era, chutando pedras, tentando encaçapá-las nos bueiros, fazendo gol; o Vô ranzinza apenas enrijecia os passos, olhos vidrados no horizonte, cara de bravo, devia ter algum compromisso sério, talvez ir ao banco, receber a aposentadoria – não consigo funcionar a memória a esse ponto.

De todo modo, o que vale pra mim é a imagem do meu avô comigo na volta desse tal compromisso do qual não me recordo. Entrávamos num boteco qualquer, dois bons homens – um de cabelo e barba brancos; outro magrinho, nem bigodinho tinha, bermudinha de tecido fininho, chinelinho pseudo-havaiana, preguinho como reparo (quem nunca?). Pedíamos cerveja Antártica e “tubaína”, pão com mortadela. Fartávamo-nos, juntos, o Vô e eu. Nem sei se havia conversa fiada. Sei do amor...

Meu avô não está mais por aqui. Ficou a saudade. Dele ainda ecoa pelo tempo o “Oba!” que gostava de gastar, cumprimentando toda gente, na volta pra casa, depois da paradinha no boteco. Momento em que já não se mostrava ranzinza, porém, moderadamente bêbado.

Se me fosse concedido um pedido, queria eu caminhar por aí, agora como avô, claro, observando meu neto chutando pedras, encaçapando-as nos bueiros, fazendo gol. Pena... Meu neto também não está mais por aqui... Dele ecoa pelo tempo infinito só a voz fininha me chamando: “Vô!”