O lençol de elástico

Certo dia, numa noite vaporosa de verão, minha mãe passava roupas e ouvia música, como de costume, na cozinha de nossa casa. Ela sempre executava as suas tarefas com música. Seja do rádio, celular, CD, DVD’s; para acordar, cozinhar, se divertir ou dormir – tudo para ela tinha uma trilha sonora única.

Naquele dia, ela separava cuidadosamente algumas peças de roupa para passar a ferro. E eu me sentava ali, de frente, fosse pra trocar uma idéia, transmitir alguma fofoca ou, simplesmente, lhe fazer companhia.

Sem interromper o que estava fazendo, ela levantou os olhos para mim e disse:

- Você sabe como dobrar lençol de elástico? Eu aprendi e não “apanho” mais.

Eu balancei a cabeça de um lado para outro, enquanto observava suas mãos pequenas e ágeis desembolando o lençol e juntando suas pontas. Pouco a pouco, aquele emaranhado de tecido foi se reduzindo a uma pequena peça dobrada e organizada. Ela pranchou o ferro de passar sobre o lençol dobrado e o colocou junto das outras peças de cama. Eu observei, satisfeita, aquela cena, pensando que aquilo poderia me ser útil de alguma forma - afinal, a solução para os lençóis de elástico sempre fora “embolar” e guardar no armário. Passar então? Nem pensar!

Hoje, quase quatro anos e meio após aquela cena, fui dobrar um lençol de elástico da minha nova cama, bem longe da minha casa materna, da nossa cozinha e da nossa mesa de passar. Repeti o mesmo movimento com os dedos, juntei as pontas calmamente e consegui chegar ao “quadradinho” ideal para guardá-lo junto das outras peças. Um vento quente me levou àquela noite de verão novamente, para relembrar as instruções e não haver erro. Minha dobradura ficou perfeita e sorri para ninguém - aqui, a quilômetros de distância, comigo mesma. Ou, quem sabe, sorri para alguém que me sorriu de volta, de algum lugar do tempo, orgulhosa do ensinamento simples – o último deles – passado de mãe para filha.

05/03/2022 - 16h02