Malhando o traidor

Quando criança, pelos idos dos anos sessenta, via meus irmãos mais velhos , Wilson, Lote, Zito, ansiosos pelo sábado da Aleluia. Dia em que desforravam toda raiva, toda insatisfação com as injustiças do mundo, sobre o boneco elaborado com pó de serra da Serraria Granado, do Sr Antonio, pai da comadre Norma, vizinho da rua São Salvador. Era uma festa. Pura diversão e desforra. Depois de muito trabalho e criatividade, eis ali o boneco vestido de roupas velhas, meias e sapatos furados, pronto para ser malhado, cuspido, enforcado-- o próprio Judas, o traidor de Jesus, que, possuído pelo demônio, diz a Bíblia – Jo 13,27 - entregou-o aos sumos sacerdotes– com um beijo no rosto - por trinta moedas de prata; nem era muito dinheiro, quantia usada na compra de um escravo; traiu por quê então? Por pura ganância? Ou seria inveja? Depois, ao ver Jesus sendo levado para o Calvário , em hebraico,

Gólgota, arrependido, enforcou-se... foi queimar seus pecados em seu próprio lugar, como também diz a Bíblia . Ainda hoje, a tradição da malhação de Judas é mantida, em algumas regiões do País, mesmo a Igreja tendo instituído o Sábado Santo, de silêncio e oração. Judas malhado e depois enforcado , representa, nas brincadeiras atuais, os políticos que, como ele, traem o povo com promessas não cumpridas, com políticas antissociais, discriminatórias e injustas. É preciso encontrar uma válvula de escape para essa classe marginalizada, sem emprego, sem as mínimas condições de sobrevivência, sem esperança. Bora construir nosso Judas. Eu tenho vários, imaginários. No Brasil? Não citarei nomes. A lista é gigante. Vai faltar pó de serra para os bonecos ...

Bemtevi
Enviado por Bemtevi em 16/04/2022
Reeditado em 16/04/2022
Código do texto: T7496132
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