A minha primeira vez

(gazeando aula)

 

Era 22 de maio de 1956. Eu estudava no período da tarde no Grupo Escolar Prieto Martinez. Primeiro ano do curso primário.

 

Na casa do outro lado da rua da escola, na esquina, tinha um macaco preso numa corrente grande o suficiente para não impedir suas micagens. Antes e depois das aulas a meninada tirava um tempo para apreciar o parente distante. Eu no meio deles. Nesse dia, entretanto, ficamos tempo demais. O sinal bateu e nem percebemos. Quando demos por nós e atravessamos a rua, o portão da entrada dos alunos já estava fechado. Restava a porta principal e uma explicação a dar para a diretora.

 

Temia passar pelo crivo rigoroso da dona Avanete Gaissler da Silva, antes de chegar à sala da professora Air Macedo em busca da minha carteira. Resolvi voltar para casa e inventar uma desculpa qualquer. Não sabia bem o quê, pois não tinha experiência na malandragem de gazear aulas. Era a minha primeira vez.

 

Cheguei em casa, entrando pelo portão dos fundos. Minha mãe, ao me ver, entre surpresa e um tanto atabalhoada, disse pegue o Vilmar e vá para a casa da oma.

 

O Vilmar é o meu sobrinho mais velho, então com um ano e um mês de idade. Feliz por não ter que me deter em explicações, coloquei o piazinho num pequeno carrinho de madeira coberto com uma lona, como se fosse uma carrocinha, que eu mesmo tinha montado a partir de um cocho sem uso, e me mandei. No caminho encontrei a tia Alzira. Ela perguntou o que tem nesse carrinho todo fechado? Embora estivéssemos no outono, o dia estava quente além da conta.

 

Abri a lona e mostrei: é o Vilmar, tia. Meu Deus! Você vai matar esse guri sufocado aí dentro, deixe essa capota aberta para entrar ar.

 

Assim o meu primeiro sobrinho foi salvo pela tia Alzira e hoje é um senhor idoso. Quando voltamos para casa, fiquei sabendo o real motivo pelo qual eu havia sido despachado com o ele para a casa da oma. O Vilson, meu segundo sobrinho, tinha nascido pelas mãos da dona Anita, a parteira do bairro. E hoje ele também é um senhor idoso.

 

 

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N. do A. – Na ilustração Vilson e Vilmar em foto do autor.

 

 

João Carlos Hey
Enviado por João Carlos Hey em 22/05/2022
Reeditado em 24/01/2024
Código do texto: T7521663
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