TRAFICO DE DROGAS EM CIDADES DO INTERIOR

O tráfico de drogas instalou-se em cidades pequenas. Fugindo da intensa fiscalização sofrida na capital das Minas, muitos traficantes passaram a eleger as pacatas cidades vizinhas da capital para atuar, usando-as como satélites e ampliando o perverso aliciamento de crianças e jovens.

O fato é que em algumas pequenas cidades as autoridades, a sociedade organizada e as pessoas de bem só começam a tomar providências quando a classe média passa a se envolver com o tráfico – e, por conta disso, também a sofrer suas conseqüências: prisões, exposição pública ou morte.

A repressão, sabemos, pouco consegue nesse combate, ainda mais se for medida isolada.

Todos sabem que uma boa rede de solidariedade e de oportunidades, bons exemplos e significativo envolvimento social podem contribuir para que a sociedade esteja protegida de várias mazelas. É sabido, também, que para que uma cidade se pense de forma solidária é necessário que sejam fortalecidas as lideranças sociais, mas, sobretudo, que os laços de vizinhança se fortaleçam e que a sociedade sinta-se estimulada à participação na arena pública.

Esperar dos governos uma solução mágica é, nesse sentido, um equívoco, embora possamos e devamos cobrar sempre por melhoria da administração pública.

E faltam exemplos em que se espelhar, capazes de suscitar na juventude uma idealização de projeto de vida que inclua a ética, a cultura e a boa convivência, inclua especialmente a realização como pessoa humana.

Que dizer de uma cidade que não gera oportunidades de emprego, fruição e diversão para seus jovens? Que dizer de uma cidade em que uma parte dos adultos responsáveis por crianças em idade de escolarização tem problemas de alcoolismo?

Como cidadãos, restam-nos a cobrança social e a mobilização, também para recuperar antigas iniciativas interessantes e que já fizeram a cidade sair de seu imobilismo. Há muito, em Pedro Leopoldo, interior de Minas, não temos campeonatos de futsal envolvendo times da cidade, como tínhamos no Ceppel ou o Festival de Verão, o Festival de Música ou o projeto Música na Igreja... o Candombe na Quinta do Sumidouro está em extinção. São exemplos, somente para lembrar que a cidade pode realizar-se como ambiente de circulação de idéias, promoção da cultura, do exporte e do lazer. Em todos os casos, não é preciso inventar a roda, mas fazê-la girar.

Lembremos também que a assistência social é um dos campos mais importantes de ação pública e social para fortalecimento social. E há urgências nesse campo: tanto no caso do Lar Solidário - que, para quem não sabe, sofre com dificuldades no diálogo com a população local – quanto no caso de projetos de complementação de jornada escolar e lazer voltados à infância na cidade, é urgente que sejam revistos os princípios fundamentais, eliminando preconceitos e a rede tutelar que costuma ser a face da ação social em várias plagas. Então, o mais difícil, muitas vezes, não é criar projetos, mas fazê-los funcionar em diálogo com a população e de maneira mais arrojada.

É importante lembrar que ações sociais e culturais precisam ser acompanhadas pelo aumento de vigilância e da segurança pública, por um plano regionalizado de monitoramento e de iluminação pública, além do rompimento com práticas de corrupção em todos os níveis. Trata-se, nesse caso, de efetiva ação institucional e governamental.

Mas, você já viu, só isso não basta. É urgente que sejam fortalecidas as lideranças sociais e as redes de solidariedade e de vizinhança, com ampliação da proteção e assistência à população carente (sem clientelismos), expansão das situações sociais de produção e circulação da cultura em todos cantos da cidade e incentivo ao esporte e à diversão em ambientes públicos adequados e para todas as idades.

Tráfico de drogas, portanto, combate-se coletivamente, sem esperança em fórmulas mágicas ou aposta em esforços isolados. Essa via só se realiza quando a sociedade, como vivência solidária, é experimentada, algo, digamos, ainda um pouco distante de nós.

Lembremos ainda que a tal fórmula que atribui à família a responsabilidade única e primeira de proteção social contra o uso de drogas pode não ser a única e talvez não a mais adequada via de investimento, aidna mais se não vier acompanhada de garantia de inserção social do jovem em redes de convivência produtiva, prazerosa e promissora. Ao incrementar as chances de realização de projetos de vida, uma cidade estará agindo para combater o uso de drogas, o que nem sempre é compreensível a autoridades que, muitas vezes por desconhecimento, outras por equívoco, investem em programas de prevenção moralistas, discriminatórios e pouco significativos. O que dizer de programas de inserção de ex-usuários na sociedade...

Há que se pensar a cidade, suas redes de sociabilidade, seus espaços públicos, a assistência social e a diversão, fomentando a sua capacidade de gestar autoridade e ordenação social, sem, contudo, privar as pessoas de viverem sua cidadania e pensarem-se como sujeitos sociais e relacionais.

E, saiba, quando eu falo em “assistência social e diversão” para todos eu não estou clamando por “pão e circo”... quando eu falo em “autoridade pública”, eu não estou recordando um “rei nu” e ao dizer “cidadania” eu penso em algo bem diferente de “folia”: os que sabem de história saberão interpretar esta mensagem.

Publicado no Jornal AQUI, Pedro Leopoldo, novembro de 2007.

Júnia Sales
Enviado por Júnia Sales em 03/12/2007
Código do texto: T762777
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