Ondas Espirais

Se eu não voltasse naquela onda, provavelmente estaria submersa onde peixes me cercariam nas proximidades do Caribe. Sem respiração, mas quem disse em respirar?

Eu precisava sentir liberdade, precisava respirar sim, usei psicologia inversa comigo mesma. E caí em meu truque. Sai correndo de casa com meu namorado preocupado, pois sabia que minha mãe não iria gostar de saber que em pleno tratamento psiquiátrico, eu estava na rua sem ela, sem a vigilância dela. Enfim, voltando ao que interessa... Eu corria feito uma criança sentindo a adrenalina no sangue e pisava em poças de chuva.

Eram oito da noite e estava correndo em direção a Avenida Atlântica.

- Me dá sua mão, vamos correr como se a gente tivesse feito merda!

Eu queria colocar mais o clima de adrenalina, mas meu namorado disse baixo pensando que eu não iria escutar: “a gente já ta fazendo mesmo...”.

Chegando no sinal da Avenida Atlântica onde daria para a praia, eu estava ansiosa. Iria cometer uma loucura. Iria ser louca, se é que já não fosse, iria experimentar a liberdade leviana, porém não trivial da existência insana. Eu queria que o sentido das coisas simplesmente não existissem, ao chegar na praia, tirei os sapatos e corri em direção ao mar sabendo que deveria obedecer a voz que me mandava fazê-lo, pois se não fizesse, iria me arrepender. E odeio arrependimentos. Transtorno de personalidade do tipo instável, subtítulo: Impulsivo.

É o meu diagnostico, e quando me dei conta estava com água até os joelhos indo para o mar – levando em conta que morro de medo do mar - , me entregar a ele, abraçá-lo, me sentir livre. O corpo submerso ou boiando é uma das maiores sensações de liberdade para a alma. O problema foi quando percebi que as ondas estavam fortes, e elas me derrubaram. Eu prendi a respiração, e senti uma liberdade tremenda. As ondas me puxavam, eu relutava um pouco me agarrando na areia e ainda com a respiração presa, pensando se morreria ali, se queria morrer ali, se deveria me deixar morrer ali, ou se valeria a pena levantar o braço e pedir ajuda ao meu namorado que via tudo sem tentar me impedir. Ele sabia que se tentasse, seria pior. Ele também sabia que eu não sabia nadar. O que adicionava uma pitada de comedia na cena. Eu estava enfrentando o mar com roupa de frio em uma noite chuvosa em que eu havia dito “hoje me sentirei livre e respirarei ar puro da liberdade”... Na verdade estava com as roupas ensopadas sendo carregada por ondas e ondas e sem respirar, mas o ‘não respirar’ me fez sentir livre... Como se eu pudesse me sentir morta por uns momentos e nisso enxergar uma certa liberdade. Afinal, a morte é um tipo de liberdade. Nos livramos do corpo e nossa alma prossegue.

Minha alma estava quase prosseguindo quando subitamente pensei em deixar a onda me levar, e uma mão segura a minha e me levanta do mar. Eu estava no mundo novamente, ressurreição. Respirava ofegante e ria feito criança, os olhos fechados devido ao sal do mar... Meu namorado soprou meus olhos e eu os abri...

A noite estava linda. E eu estava horrível.

A chuva havia cessado. Eu me encontrava em paz.

Uns mendigos passaram por nós dois e começaram a rir de mim, e eu comecei a perceber como a loucura é saudável. Como a loucura deveria ser libertada de seu estereotipo ruim... Mas se bem que se a loucura não fosse loucura, ela não seria loucura. Isso faz sentido? Se a resposta for ‘não’, eu consegui o que queria.