Subindo o morro

Mas quantos anos têm esses morros, essas rochas? Milhões! Não havia ainda ser humano, mas os morros e as rochas já estavam por aqui. Um dia o ser humano surgiu, cresceu e evoluiu, até chegar o momento em que alguns espécimes passaram a subir esses morros e a escalar essas rochas não porque precisam, mas tão somente porque querem fazer uma coisa diferente.

Durante a subida, olho para baixo. Lá vêm três espécimes que eu amo. “O Henrique não tinha um presente melhor para pedir de aniversário?”, diz um deles. Não é verdade, não totalmente. Essa subida já era um plano nunca antes concretizado. Mas, sim, eu pensei em tê-los comigo o dia todo no meu aniversário, é um sábado, tem que aproveitar quando o aniversário é sábado.

São 36 anos, duas maioridades. Já é um bocado de anos para um ser humano, mas quase nada para esse morro e essas rochas. Tenho experiência em subir degraus, mas morro é novidade. “O Morro do Canal é o mais fácil”, disse minha irmã. Acreditei, acreditei até que começamos a subir. O começo já é bem pesado, talvez para que os receosos e despreparados desistam já ali.

Meus joelhos estalam, mas não desistimos. Escalamos pedras, entramos em buracos, pegamos em cordas que estão ali para evitar que rolemos morro abaixo, apoiamo-nos em galhos ou no próprio chão, e vamos indo em frente, para o alto – 1,3 quilômetros morro acima, quase 1,4. Há pessoas que já estão descendo. Subimos tanto, mas o topo parece que não chega nunca!

Às vezes, há uma área mais limpa e olhamos ao redor. Já é impressionante estar ali e ver todo esse verde. Somos gente da cidade, dos carros e da fumaça, e, de repente, estamos ali no meio da mata. Seguimos, sofremos, suamos, mas sinto-me bem a ponto de encabeçar o grupo. Uma vez, adianto-me demais e sento para esperá-los. Sim, está sendo um aniversário bem legal.

Mais um pouco, mais um pouco... O topo! Temos ali a visão de milhões – de anos. Pode ser que a evolução não tenha direção nem propósito, mas chegou a resultados interessantes, como esse de estarmos ali em cima, quatro pessoas distintas, que não nasceram parentes, mas se uniram pela afeição e agora contemplam a vastidão do mundo no aniversário de uma delas.

É fim de tarde e, quando descermos, poderemos ver o sol se por. O dia terminará, e com ele o passeio e a data comemorativa. Em algum momento, nós também não estaremos mais aqui, e o morro e as rochas continuarão. Toda nossa luta é para juntar, na fugaz passagem que temos, alguma coisa que sobreviva a nós mesmos. Em dias como hoje, eu acho que a gente consegue!

Henrique Fendrich
Enviado por Henrique Fendrich em 27/05/2023
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