Crianças cibernéticas

Crianças cibernéticas

A informática e especificamente a internet podem parecer um bicho de sete cabeças para os adultos, mas as crianças de hoje, a partir dos três anos de idade já começam a ter contato com o mundo dos computadores sem demonstrar nenhuma dificuldade. As escolas (principalmente as particulares) já incorporaram a matéria ao ensino. E todos nós sabemos que na infância as coisas são muito mais simples e rápidas de se aprender. Aquelas aulas de pintura, molduras com massinhas, educação física que nós tanto apreciávamos em nosso tempo de escola, hoje são consideradas “chatas” pelas crianças que esperam ansiosas pela tal aula de informática. Pergunte à uma criança de hoje se ela sabe o que é uma capucheta, talvez pense que você está querendo ensinar palavras de baixo calão; Se já viu ou brincou com um peão de madeira; Um caleidoscópio então... Provavelmente vai pensar estarmos falando sobre algo sobrenatural, ligado a astrologia talvez, ou a observação das estrelas. Estilingue, Cinco-marias, marionete, jogo de botão, nada disso faz parte do vocabulário e do conhecimentos das crianças de hoje, mas se perguntar por Plastation, PC, HD com certeza teremos uma resposta imediata.

Dia desses resolvi levar minhas filhas para uma visita a casa do avô, e lá estava meu pai, sofrendo diante do computador para fazer uma simples planilha que deveria enviar para um cliente, pois bem, minha filha mais velha (15 anos) trocou o trabalho de desenvolver a planilha (feita por ela em apenas dez minutos) – e que ficou muito melhor do que ele mesmo esperava – por algumas horas de uso em seu computador para falar no MSN. Segundo ela, aquela foi a melhor visita que já fez à casa do avô.

Ontem minha filha do meio (12 anos) me pediu ajuda para fazer um trabalho escolar, fiquei feliz, e perguntei: O que iremos pesquisar? Pesquisar? Respondeu ela com outra pergunta. Sim, qual o tema do trabalho? Para que eu possa pesquisar na enciclopédia. Depois de alguns risos pela palavra enciclopédia, ela disse: Não pai, eu já pesquisei no “google” e encontrei tudo o que queria, só preciso da sua ajuda porque na hora de imprimir está saindo aquelas linhas com o endereço eletrônico do site no rodapé da página, e a professora disse que vai descontar nota caso isso aconteça. Semana passada o Luizinho deixou todos os endereços dos sites onde ele copiou o trabalho, não tirou nem aqueles links de propaganda, e a professora descontou nota dele, e ainda disse que era uma vergonha, um desleixo, que assim era muito fácil entregar um trabalho. Pensei um pouco e perguntei: Mas sobre o que é esse trabalho? Aquecimento Global. Respondeu ela. E o quê você falou sobre o aquecimento Global? Eu não tenho que falar nada pai, eu copiei e colei no Word, mas é muito importante tirar essas letrinhas do final da página, a professora não pode saber qual é o site, entende? Acho que ela não gosta de saber qual o site, só quando ela mesma indica onde devemos pesquisar um assunto. Ela indica os sites onde devem procurar um determinado assunto? Perguntei assustado. Claro pai, tem temas que são muitos difíceis. Preciso conversar com essa professora, onde já se viu, aceitar trabalhos copiados da internet, e ainda passar o endereço do site, não dá aos alunos nem mesmo o trabalho de pesquisar, procurar sobre o assunto. Vou falar com essa professora hoje quando te levar para escola. Ela me olhou ressabiada: Pai, ela não recebe ninguém nos horários de entrada e saída da aula, para falar com ela você tem que marcar um horário. Então marque esse horário! Falei irritado. Não pai – respondeu ela rindo – Você tem que entrar no site da escola, escolher a opção mensagens, depois professores, procurar pela minha professora “Dona Marlene” e depois marcar a opção “agendar horário”, muito mais fácil que ficar procurando a professora pela escola, ou atrapalhar a aula, não acha? Depois disso acabei desistindo de falar com a professora, deixei minhas filhas na escola e fui para o trabalho.

Quando voltei já era noite, precisava ligar o computador e enviar a crônica para a revista, então me lembrei que havia gravado o texto em um pen-drive, e o esquecera no porta-luvas do carro. Chamei minha filha mais nova (10 anos): Bruna faça um favor para o papai, vá até o meu carro e pegue o pen-drive que esqueci no porta-luvas. O que é isso? Perguntou ela. Sorri e pensei: “Afinal uma criança que ainda não está totalmente influenciada pela febre da informática” Então comecei a explicar: Filha, pen-drive é uma pequena pecinha que... Não pai, o que é porta-luvas?

Marcelo Nocelli
Enviado por Marcelo Nocelli em 19/12/2007
Código do texto: T784911
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