ENGESSADOS

ENGESSADOS

Já perdi a conta do número de vezes em que quebrei ou trinquei algum osso do corpo.

A primeira vez, a gente nunca esquece! Foi uma fratura chamada “em galho verde”. Estava no meio de costumeira traquinagem e vapt-vupt: meu antebraço ficou envergado.

Depois disso foram tantas e tantas, que me é impossível precisar. Em uma ocasião quebrei os dois punhos, simultaneamente. Façanha imensa!

Portanto é fácil supor que estive muitas vezes em entrevista com um médico ortopedista.

Mas a vida dos doutores do esqueleto não anda nem um pouco fácil. Foram quatro deles que levaram tiros, resultando em três mortos. No Rio de Janeiro, a cantada Cidade Maravilhosa!

Eles tomavam inocentemente algumas brejas, para espantar o calor e dar umas boas risadas antes do exaustivo Congresso Médico que começaria no dia seguinte. A beira da praia, o calçadão da Barra, o evento científico, tudo deveria ser experimento idílico para guardar-se na memória, do prazer.

Mas dessa vez, não! Alvejados por projéteis cuspidos de armas de fogo, três colapsaram ali mesmo. O outro, levado ao hospital às pressas, tem boas chances de sobreviver.

Analogicamente, eu comparo o Rio de Janeiro dos dias atuais, ao gesso. Material tão caro aos proficientes doutores que o utilizam para consertar os nossos ossos quebrados, a cidade carioca engessa (e há muito tempo) o cidadão de bem. Impede-o de sair de casa em noites quentes, convidativas ao lazer. Restringe os seus movimentos, obriga-o estar diuturnamente atento a ameaças imprevisíveis, impede-o de ir e vir tranquilo.

Drogas, associações criminosas. CeVês, PêCeCês, Milícias. O crime organizou-se nos moldes da moribunda Cosa Nostra italiana, subornando e imiscuindo-se em toda estrutura Estatal, que deveria nos proteger. O Estado deveria ser o capacete de nós, motociclistas, o cinto de segurança do automóvel que guarnece os seus passageiros. Cidadãos, todos nós somos cidadãos!

Por inépcia ou azeitados pela corrupção, só nos resta protestar e mostrar aos nossos governantes e políticos a nossa indignação. E o nosso medo, que nos mantém engessados, trancados dentro das quatro paredes das nossas casas.

Paulo de Bulhões Marcial Neto
Enviado por Paulo de Bulhões Marcial Neto em 06/10/2023
Código do texto: T7902503
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