Melancolia

A solidão da velhice é de matar. Eu, com meus 84 anos, depois de ter vivivo tanto, cuidado de filhos, marido, netos, hoje me encontro aqui em minha casa, sozinha. Pelo menos é como me sinto. Algumas famílias, quando se deparam com a velhice de um ente querido se organizam, se resolvem e cuidam da pessoa na saúde, na doença... Esse não é o meu caso.

Meus filhos fogem da minha casa, da minha presença, não se dão, não convivem... O que eu fiz de errado? Quando se encontram é discussão, cobrança, gritaria e eu no meio disso tudo querendo dizer quase sem forças: Eu estou aqui.

Hoje sou eu e ela, ela é quem cuida de mim como uma leoa, mas esse animal feroz às vezes me morde, se queixa, reclama, brada aos quatro cantos que não aguenta mais. Eu suplico companhia, a presença dela. Quando ela sai, me desespero, me sinto sozinha, tenho medo, é só com ela que posso contar. Mas, é só com ela que ela me deixa contar. Às vezes ela é tão amorosa, cuida e se preocupa comigo, mas de repente se afasta, me repele, não tem paciência, quer fugir. Eu preciso dela.

Já não me lembro bem das coisas, a vida foi dura comigo. Pergunto duas, três vezes, tudo me escapa. Estou trêmula, frágil, tento ir ao encontro das pessoas, mas isso me consome. Como é triste, meu Deus, ficar sozinha, longe dos meus.

Minha casa vivia cheia de crianças, o cheiro de frutas, bolos, comidas saborosas perfumava todo o ambiente. Eu me sentava no chão e brincava com eles, rolávamos no chão, ríamos e sentíamos o calor do amor entre nós. Não queriam ir embora, nem quando vinham buscá-los. Hoje onde estão? São jovens e adolescentes envolvidos nos estudos, na busca por uma profissão, outros constituindo família e eu querendo voltar no tempo e ouvir os risos, sentir as mãos pequenas tocando meu rosto, meu cabelo, responder as perguntas, dividir experiências, a vida.

Sinto que fiz algo de errado. Converso com Deus, oro, suplico, mas apesar de tanto ouvir que as pessoas escolhem seus caminhos, ainda sinto um peso na cabeça e no coração, algo faltando. Espero poder descansar, dormir, não mais acordar, fugir desse sentimento que me corrói. Espero.

Eliane de Jesus
Enviado por Eliane de Jesus em 31/10/2023
Reeditado em 31/10/2023
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