Cenas do cotidiano

Cenas do cotidiano (Há muito não escrevia sobre um dos meus temas favoritos)

Manhã de domingo linda,com cara de primavera,pelo menos no finalzinho da estação,e onde estou? Na fila de supermercado!Faço isso ao longo da semana.Compro o necessário para a semana e,quase sempre,minhas compras acontecem no final da tarde,quando estou voltando de minha caminhada diária.Aos domingos,gosto do burburinho das filas .É diferente.Há um clima mais descontraído e feliz.

Pego uma fila menos e o que levo ao caixa não encheu nem ninha cestinha.Á minha frente uma senhorinha(aparentava uns oitenta anos),um homem na faixa dos quarenta e poucos e uma criança de uns sete anos.Fiz o que faço sempre quando vejo que, quem está antes de mim, tem muitos itens dentro do carrinho e percebo que atrás a fila já se alongou.Deixo minha compra sobre a esteira e vou pra frente do caixa abrir sacolinhas.Já virei especialista no assunto.Abro rapidinho e ainda costuma colocar uma dentro da outra pra suportar mais coisas e adiantar o expediente. Às vezes vejo um comprador consciente com sua tradicional sacola de tecido,que não usa as sacolas.Faço isso às vezes também.Mas não é o usual.Aqui em BH,há uma década ,houve uma pequena revolução.Uma vereadora liderou um movimento e as sacolas tiveram que sumir dos supermercados,por força de Lei.Chegaram a colocar em todos os estabelecimentos as sacolas biodegradáveis( pagavam-se centavos por elas).Achei isso um luxo! Mas a Lei caducou e voltamos à estaca zero.Confesso que faço uso das sacolinhas diariamente,mesmo sabendo que ecologicamente não é o correto.Mas....voltando à minha fila domingueira.

Depois de abrir uma quantidade imensa de sacolas com o objetivo de agilizar a fila do caixa,que já entortava entre os corredores,as compras da senhorinha foi paralisada no pagamento.Ao abrir a bolsa,percebeu que não tinha o cartão de crédito,só o de débito.Depois de uns minutinhos de atraso,o filho resolveu tirar a mãe da fila e disse à moça do caixa que daria um pulo em casa (perto) para pegar o seu cartão.Esses perrengues não são raros,como também não é a situação que presenciei.Enquanto os itens da compra iam sendo registrados,ouvi uma conversa entre a senhorinha (detentora do cartão),o filho e a criança.Em tom baixo e educado. Era impossível não ouvir, pois eu estava atrás deles para pagar e fui pra frente (igualmente perto) abrir sacolinhas:Mãe,a senhora tem que dizer não a ele.Criança precisa saber que não pode pedir qualquer coisa que vê.Se a senhora não fizer isso,ele vai mandar na senhora e vai crescer sem limites.Olhei para a senhorinha que,em voz bem baixa,retrucou:Mas isso é só de vez em quando.Ele fica tanto tempo sem me ver.Não custa nada eu fazer uma agrado.Nossos olhares se cruzaram (eu sempre antevejo algumas ternurinhas).Entrei no assunto,olhando para o homem:Deixa ela!Sei que está feliz em fazer a vontade do netinho ( que na verdade era bisneto).De vez em quando não faz mal! É só ensinar em casa os limites e não permitir os abusos.Realmente a criança não fazia alarde,nem birra,só segurava um pacotinho de balas coloridas cheio de alegria.Mas a compra não se efetivou.A senhorinha saiu da fila com o seu carrinho,enquanto aguardava a chegada do filho com o outro cartão.Continuei abrindo sacolas,enquanto aguardava o registro de minha pequena compra.Acertei,peguei minhas sacolas,mas não sem antes parar perto da doce senhorinha.Ao me ver aproximando, abriu um sorriso e me perguntou:Qual é o seu nome?Queria te agradecer pelo que falou lá na fila.Só queria dar um agrado ao meu bisneto.Ele agora vai pouco na minha casa. Eles não entendem!O garotinho olhou pra mim,pra ela e perguntou:Vocês se conhecem,Bisa?Eu disse:Tive o prazer de conhecer sua bisa agora.Trate muito bem ela,viu?Nunca peça o que ela não puder te dar.E sabe como vc pode agradecer?Ao chegar em casa,dê muito carinho a ela.Ter uma bisa amorosa assim,é um luxo.Ele esboçou um sorriso de menino.A senhorinha?Me deu um abraço tão gostoso que iluminou o meu domingo.

É !Existe beleza oculta em todos os lugares,nas filas dos supermercados também.

Em tempo:Falei de ternura,de delicadeza,mas tem também o interdito.A gente sabe que são os idosos que mantém boa parte das famílias.Na maioria das vezes, são EXPLORADOS econômica e afetivamente.Este é o lado triste da história!

Amarília