O mistério dos vândalos

Quando eu era menino, li num surrado livro de história, que “os vândalos, bárbaros vindos do Norte, saquearam Roma no ano de 455”. Quantos mistérios num simples período: quem eram os vândalos? Ao norte do arraial ficava a colônia alemã, os vândalos eram de lá? Bárbaros significava o quê? Eu conhecia Santa Bárbara, cujo nome era invocado quando trovoadas poderosas apontavam no alto da serra. A santa era aparentada com os vândalos? E saquear? E Roma?

 

Na escola isolada onde eu estudava, não havia dicionários, nem enciclopédias, mas havia dona Lídia, que ensinava com amor, laconismo, e com a palmatória sempre ao alcance das mãos. Se ela não pudesse responder às minhas perguntas, ninguém mais poderia:

 

— Dona Lídia, a senhora pode me dizer quem são os vândalos?

 

— É gente arruaceira, que não respeita a propriedade dos outros.

 

— E os bárbaros professora, quem são eles?

 

— É gente que não teme a Deus.

 

— E saquearam significa o quê?

 

— Saquearam vem do verbo saquear. Eu já não te ensinei a conjugação dos verbos?

 

— Ensinou, sim senhora, mas esse verbo aí eu não conheço.

 

— Saquear significa roubar, pilhar, afanar.

 

Perguntei também se Roma ficava muito longe do nosso arraial. Dona Lídia ameaçou sorrir, mas conteve-se.

 

— Roma é a capital da Itália. É a cidade onde São Pedro foi crucificado… de cabeça para baixo, porque ele se achava indigno de morrer como Jesus Cristo, nosso Salvador.

 

Com as respostas de dona Lídia pude desvendar o mistério: um bando de arruaceiros, que não temiam a Deus, pilharam a cidade onde São Pedro morreu crucificado de ponta-cabeça. Os vândalos, definitivamente, nada tinham em comum com a gente da colônia alemã.