Medo de Escrever

Escrever esse texto, pelo menos para mim, é a personificação de uma antítese cruel: por um lado, eu gosto muito de reclamar da vida, principalmente quando posso destilar críticas ácidas e corrosivas para as coisas que me incomodam. É um prazer particular. Contudo, o simples ato de expor minhas vulnerabilidades é praticamente deprimente. Um escritor que tem medo de escrever tão útil quanto um Superman com medo de altura, um Thor com medo de trovão ou ainda um Homem-Aranha com aracnofobia. Santa complicação esses casos onde nossa maior fraqueza se esconde em nosso maior poder.

Mas continuando o raciocínio, por que ter medo de escrever? Boa pergunta. Fazendo essa página em branco de divã e quem vier a ter contato com esse texto, de terapeuta, posso listar inúmeras razões, apesar de nenhuma delas me parecerem uma justificativa plausível para justificar os meus ociosos bloqueios criativos.

O primeiro dos medos é que a minha escrita revele a todos que sou uma fraude. Sim, isso daqui é totalmente sem cabimento, porque se há algo que posso me orgulhar dos meus textos ruins é que toda a má construção e a péssima inspiração e organização de ideias são genuinamente minhas. A fraude talvez seria o fato de que eu não sou tão bom assim, e que nem todo o esforço do mundo me fará ser tão bom assim. Orgulho, vaidade, é dureza saber que não estou totalmente livre das armadilhas do ego, reconhecer ainda a minha parte falha humana e mortal a qual nem sempre o bom senso e a humildade conseguem se sobressair. Escrevendo agora parece que estive um bom tempo caindo em um poço, tentando me segurar em paredes de lodo. Ao que parece, esse é o fundo dele, a fria lama dos que, na impossibilidade de resolver seus problemas, só podem apenas comentar sobre eles, e de novo, friso que detesto isso. Não é como se fosse o fim do mundo, como se eu fosse demitido do emprego ou ainda como se meu computador parasse de funcionar. Estou bem, até um certo nível, mas esse medo de escrever ainda me incomoda.

O segundo dos medos, talvez o mais aterrorizante, é não conseguir criar vínculos com os textos. Os três recentes anos da minha vida foram marcado por um intenso bombardeio de textos acadêmicos-científicos, o que por sua vez, exigiu uma compreensão rápida e objetiva de informações. Em resumo, parece até que isso acabou com toda a graça da leitura. A mente não volta mais a navegar no mesmo ritmo de antes, e a imaginação é um bem escasso. Imagina-se cenas, perfeitamente visíveis, mas os sentimentos foram de aceleradores de batimentos cardíacos para um simples complemento da cena. Estudei um pouco acerca de escrita criativa e criação literária, dominando uma certa variedade de técnicas de estruturar enredos e narrativas. Mas não adianta nada o curso de pedreiro, arquiteto e em engenheiro civil se não há tijolos, cimento, areia e outros materiais para a essência da obra que se quer construir. Pessoas morrem, mas não há comoção, casais se casam, mas não há amor; vilões roubam, mas não há revolta. Letras existem, mas não há literatura.

O terceiro medo, e prometo encerrar por aqui para tentar preservar o pouco de dignidade que ainda me resta, é o de que tudo continue igual. Nas aulas de literatura, é comum encontrar apontamentos que traduzem que todo escritor deseja ser lido, e que a literatura é sim uma forma de mudança, seja ela pessoal ou social. Mas se uma obra não tem tanto impacto, parece um tempo e dedicação jogado no lixo. Antes de mais nada, esclarecer que não é uma cobrança para que um autor seja disso, longe disso, uma leitura obrigatória e forçada não costuma ter bons resultados, a grande questão é reforçar o sentimento de que, o texto ainda é importante, mesmo que ninguém ligue para ele, o autor ainda o liga e o ampara, e é algo do qual eu sinto falta. Meus textos estão mudos para mim, ou talvez eu que esteja surdo para eles. A mudança é inevitável, certo, mas profundamente não gostaria que minhas mudanças me levassem para longe da escrita.

Até então, esse texto se sobressai. De olhos fechados, aprendemos que não temos medo da própria escuridão que criamos, então seja isso uma razão pela qual um texto sobre o medo da escrita tenha submergido agora. Agora é precisar descobrir o que fazer para que essa pequena brasa volte a se tornar a boa e velha chama olímpica da vida de escritor.