🔴 🔵 Arcanjos, principados e potestades: uma batalha celestial silenciosa

A Igreja Adventista era praticamente uma fachada para o colégio particular. Quando eu passava em frente, via que o uniforme já exercia uma superioridade estética sobre a minha escola pública. Aquele depósito de gente, onde estudávamos nós, os pobres, mas limpinhos, era uma das últimas chances de escapar do analfabetismo brasileiro.

Fui convidado para uma festa do colégio Adventista. Eu sabia que aquele território era muito diferente da minha escola municipal. Entretanto, fora a diferença social acentuada dos anos 80, acredito que não haveria mais que uma porção de crianças correndo no pátio e uns artigos importados, tipo relógio ‘G-Shock’ e tênis “da hora”.

Chegando à tal festinha, conheci o Satã. Aquilo devia ser a abreviação do nome “Satanás”. Logo vi que a tentativa de deixar o nome menos assustador só podia ser para enganar os mais distraídos. Portanto, era necessário manter uma distância segura de alguém com aquele nome. Francamente, aquilo não poderia ser deste mundo.

Apesar de se tratar de uma criança, aquele garoto maroto realmente tinha um nome que impunha respeito. Não sei se respeito ou medo, mas aquele garoto poderia ser chamado a qualquer momento de senhor Satã.

O moleque com o diabo no corpo exercia algum tipo de poder e angariava uma legião de seguidores. “O capeta em forma de guri” realmente estava à frente do seu tempo, a palavra “bullying” nem era usada para descrever o terror que o garoto espalhava naquele colégio religioso.

O Satã me pareceu ser um carinha legal, talvez temendo meu nome ou por eu ser um sobrevivente do sistema público de ensino — tipo alguém que saiu da cadeia ou faça parte de uma gangue. Apesar de oriundo do lugar que tinha fama de ser a reunião da escória da juventude guarulhense, eu jamais poderia imaginar que intimidaria alguém conhecido como Satã.

Eu sempre achei que aquele prédio era uma igreja que tinha uma escola, no entanto, depois que eu conheci seu pátio e corredores, constatei que tratava-se de um colégio que tinha uma igreja.

Uma aparente santidade, superioridade e disciplina sobre uma escola da Prefeitura, que continha alunos do naipe do Oreia, “Zóio”, Suíno, Pescoço, Cascão e grande elenco, foi destruída por um garotinho com um singelo nome à prova de “bullying”: Satã.

RRRafael
Enviado por RRRafael em 08/05/2024
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