Dia de Feira

Entre a barraca de peixes e a barraca do pastel, lá estava uma senhora, toda toda, de óculos escuros e tudo, se achando a dona do pedaço. Odete se aproximou, assim como quem não quer nada. Ficou um tempão só observando de canto de olho até concluir que, 30 anos depois, lá estavam as duas, frente a frente novamente.

- Você por aqui?

- Desculpa, eu te conheço?

- Eliane, não é?

- Acho que a senhora está me confundindo…

- Confundindo? Eu tenho memória fotográfica, Eliane!

- Meu nome não é Eliane!

- Mas que cara de pau….mudou de nome, é?

- Sai daqui…por favor!!

- Quem diria, hein, Eliane….30 anos depois…

- Eu já falei que não me chamo Eliane!

- Vai, tira esses óculos escuros, que eu quero ver!

- Eu não posso com o Sol.

- Que foi, tá com medo? Tira os óculos…

- Me larga!

- Eu esperei 30 anos por este encontro…

- Isso não é um encontro!

- Você continua com aquele traste?

- Não sei do que você está falando…

- Não se faça de sonsa, Eliane…

- Eliane é a puta que te pariu!

- Aposto que você aprendeu a falar assim com o seu marido…

- Mas eu nem sou casada…

- E essa aliança aí no dedo?

- Sou viúva…

- O Aguinaldo bateu as botas?

- Como é que eu vou saber??? Não sei quem é Aguinaldo….aliás, nem sei quem é você!

- Ora…não me venha com essa, Eliane…tira essa máscara antes que eu arranque…

- Já falei que eu não chamo Eliane!

- Me deixa ver sua identidade!

- Me larga, me larga!

- Só quero ver a foto…

- Vai pra lá!!! Me largaaaa!!!

Odete tinha certeza de que finalmente tinha encontrado Eliane e partiu para a briga com toda sua força. Ela só não sabia que de Eliane, aquela senhora não tinha nada.

Assustada, a mulher não sabia mais o que fazer. Pensou em pegar a peixeira do peixeiro e enfiar na jugular daquela doida varrida. Pensou em jogar Odete contra a frigideira de óleo quente do pasteleiro para desfigurar ainda mais aquela cara feia. Pensou até, vejam só, em aceitar aquela loucura e dizer que realmente era ela a tal Eliane.

Mas de tanto pensar, a mulher acabou caindo do cavalo. Quando a polícia chegou para colocar ordem na baderna que a feira havia se transformado, ninguém quis saber quem começou a briga. Foi cacetete para tudo quanto é lado e as duas acabaram dentro do mesmo camburão, algemadas, rumo ao hospício mais próximo. E enquanto uma gritava “Meu nome é Teresa! Meu nome é Teresa!”, a outra retrucava “Impostora! Impostora!”.