LEMBRANÇAS DO VELHO CINEMA

Em quinze de agosto de sessenta e dois o Cine São Geraldo, apesar de todas as festas que comemoravam mais um aniversário da cidade, exibia “A luta pelo petróleo”, com o ator Richard Alden. O filme era tão bom que nunca mais se ouviu falar dele. Mas o Cine Jaú estava fechado para as reformas que lhe deram nova e moderna aparência, dotando-o de aparelhagem apropriada para exibição de produções fotografadas pelo sistema panorâmico, ou “cinemascope”, como se dizia então. Ou seja, aquela tela retangular que revolucionou a sétima arte no início dos anos cinqüenta. A partir dessas mudanças, passou a ser chamado de “palácio encantando da cidade”. E era mesmo! Numa época de raras oportunidades em termos de diversão, ele era uma das poucas opções, além do tradicional e inesquecível desfile de moças defronte ao jardim de cima, na Rua Lourenço Prado.

O tradicional cinema foi muito importante para a minha e outras gerações, anteriores e posteriores. Ali fizemos muitas descobertas. Algumas bem interessantes, sem dúvida. Vivemos grandes emoções, rimos, choramos e, podemos dizer, sentimos o sabor de beijos e carícias muitas vezes até proibidos. E, pode crer, a grande maioria foi inesquecível! Cada vez que ouvirmos o seu tradicional prefixo, adotado no início dos anos sessenta e retirado da trilha sonora do filme “Amores clandestinos”, um sorriso de saudade aflora involuntariamente. Até porque algumas situações eram clandestinas mesmo!!!

O Cine Jaú teve duas fases. Da sua inauguração, no início da década de quarenta até a reforma. Depois, desta até o encerramento de suas atividades, no final dos anos setenta. Para quem não o viu ou não se lembra, ele possuía dois pavimentos e, na primeira fase, ambos eram dotados de poltronas de madeira, um tanto desconfortáveis, diga-se de passagem. Mas, quem se importava com isso, apesar do São Geraldo possuir assentos estofados e, de vez em quando, vender ingressos numerados? A extinta casa de espetáculos tinha um charme especial.

O térreo era chamado de platéia e tinha a preferência do público, até porque oferecia uma visão melhor. O andar superior, ao qual se chegava através de duas escadas laterais existentes no saguão de entrada, chamava-se balcão e o seu ingresso era até mais barato. Muitos só o aceitavam quando, em produções de grandes bilheterias, não havia outro jeito. Mas, existiam os que optavam por ele, durante a semana, ocasiões em que sua freqüência era reduzida. Afinal, as possibilidades que proporcionava eram muitas, mesmo naqueles tempos sisudos.

A cabine de projeção ficava no fundo do balcão, ladeado por dois sanitários, geralmente mal cheirosos, guarnecidos de cortinas verdes. Não faz muito tempo, o Dornelas, que hoje reside em Bocaina, lembrou desses famosos ornamentos! A luz que emanava da sala de exibição, nas cenas mais claras, até atrapalhava um pouco. Mas, nos momentos mais escuros, principalmente em filmes policiais fotografados em preto e branco, ajudava muito.

Um dia, meio de repente, o prédio foi demolido. Restaram apenas as “lembranças do velho cinema...”

(P. Preto é jornalista).