CRÔNICA NO TEMPORAL

Quando vou iniciar uma crônica, confesso que me preocupo em criar um texto que seja intemporal, ou seja, que em qualquer tempo possa ser lido, sem vínculo com um personagem ou fato atual, que sejam passageiros e que, daqui a muitos anos, todos entendam o que está escrito nele.

Eu tento, mas quase nunca consigo, pois estamos permanentemente atrelados aos fatos à nossa volta.

Não esqueço que a crônica, como definição, é uma narrativa de fatos, geralmente atuais, o que, já derruba a minha preocupação inicial, para não dizer toda a minha tese.

A verdade é que os maiores cronistas que eu conheço, escreveram crônicas que podem ser lidas a qualquer tempo, e estão cada vez mais atuais.

Existem vários assuntos que podem ser abordados, em qualquer época, que, também vão estar sempre atuais, tais como: falar mal do governo, o programa do Sílvio Santos, a prostituição de algumas artistas, a má qualidade da programação da tevê, da cegueira da justiça, da infidelidade amorosa, da zona que é a política, de esposa mandando em marido, etc.

Uma forma de conseguir fazer uma crônica intemporal é falar mal do governo. Aliás, esse assunto é conversa garantida em táxis, em cabeleireiros, em fruteiras, em filas de beneficiados do governo, em botecos e em mesas de reuniões do próprio governo. Eles apenas conduzem mal o país, não são burros.

Falar mal do governo é garantir um assunto negativo, que não envelhece, mas, se quiser garantir um texto que atravesse o tempo e que seja um assunto positivo, pode-se falar, por exemplo, sobre o sorriso de uma criança. Ele sempre será eterno, gratificante e puro. O que pode mudar é só um detalhe: dependendo da época em que o mundo esteja, esse sorriso pode ser completamente banguela ou com implantes ortodônticos de fissão nuclear.

Falar do amor é sempre atual.

Falar da paz parece ser só possível em tempos de guerra.

Agora, quanto aos escândalos políticos, não tem tele-transporte ou desintegração de matéria, que consigam dizimá-los de nossas vidas, nem de nossas crônicas, nem no passado, nem no futuro.

Sérgio Lisboa.

Sérgio Lisboa
Enviado por Sérgio Lisboa em 16/03/2008
Código do texto: T903113
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