O seu Carlos e a Juliana Paes.

            Chegou. Sentou-se. Pediu uma cerveja.

            - Está aqui... Geladinha.

            - Não obrigado! Não quero skol, quero antártica.

            - Mas o senhor só pede skol há anos.

            - Mudei de idéia.

            - Mas eu já abri a cerveja... Como fica?

            - Não fica. Dê ela para alguém, por que essa eu não pago.

            - O senhor está de brincadeira com a minha cara, né?! – falou indignado o dono do bar.

            - Por favor, a antártica.

            O dono do bar voltou contrariado. O mar não estava para peixe, ou melhor, a bebida não estava para bêbado – vulgo bêbo no linguajar dos embriagados habituais. Uma cerveja daquela era um custo daqueles. Por final, decidiu que iria tomar a cerveja juntamente com a Mariquinha, a mulher da vida da quadra.

            - Aqui está a sua antártica.

            - Valeu Alfredo. Sempre o Alfredo...

            - Ah! Pensei que tinha mudado por completo. Pelo menos lembra meu nome... Mas deixa eu te perguntar uma coisa?

            - Sim. Disponha.

            - Por que a antártica?

            - Por quê? Você viu quem é que está fazendo a propaganda da antártica?

            - Sim. A Juliana Paes. Mas...

            - Mas nada. Só isso vale. Essa cerveja ficou boa... Ah! E põe essa na conta.

            Ficou ali, naquela posição de largada de corrida de cavalo, por horas a fio. Olhar fixo. Não se sabe o que se passava em sua cabeça. Rodava com a mão direita o copo de vidro: daqueles que vêm com extrato de tomate. Mas sem desgrudar os olhos um só minuto daquela singular garrafa. A cerveja, agora sem gás, estava no mínimo imbebível: cerveja quente não dá.

            - Seu Carlos, tenho que fechar o bar!

            - Tudo bem. Faz assim, me dê uma sacola que não seja transparente, que eu vou levar essa comigo.

            - Mas o casco não pode ir.

            - Alfredo! Sou seu vizinho. De manhã eu te devolvo.

            - Tudo bem.

            O dono do bar pegou a sacola, que estava cheia de pão, e deu ao velho (sem os pães, claro). Esse ensacou a cerveja com todo o carinho, perecia que embrulhava um pedaço de diamante. E lentamente ia saindo. O dono do bar, encabulado com aquela cena, que só se vê nos núcleos pobres dos filmes e novelas, ou ainda nos bares daquela região, intervém:

            - Seu Carlos?!

            - Quê?

            - Quê que o Senhor vai fazer com essa cerveja quente?

            - Não sei! Quem sabe?! – Respondeu enigmático, com um leve sorriso maroto no canto da boca. E saiu meio cambaleante.

            No dia seguinte, quando o Alfredo abriu a porta do bar, de manhã cedo, percebeu algo escrito no chão contiguamente ao estabelecimento. As letras um tanto difíceis de entender, que decifrando ficou mais ou menos assim:

 

“DESCULPA. SEQUESTREI A JULIANA PAES. É MUITO LINDA. OBS: É MUITO BOA DE CAMA TAMÉM”.

           
            
O seu Carlos nunca mais deu ar da sua graça naquele humilde bar da esquina. Grande seu Carlos.

            Aquela sua última frase fora um mistério. Em frente do bar, reuniam-se ávidos curiosos – vulgo fofoqueiros de plantão. Mas ninguém sabia dizer o real significado daquela frase. E sem testemunhas: o velho morava só.

            Bem, o Alfredo parou de vender antártica:

            - Vai que vira moda. Racha com o meu negócio.