Carta de um cara qualquer

Reflexivo, ouvindo "Moonlight Sonata" de Ludwig Van Beethoven, penso: "Por que minha vida amorosa é uma tragédia?" Nada me falta, tudo tenho para ter sucesso. Creio então, que é simplesmente isso. O quê? Não sei, não sei...

Luna não quer ver minha cara nem pela webcam. Sempre que a chamo para sair, comer alguma coisa, ir a um café, um cinema, coisas que ela adora, ela dá uma desculpa. Estudando? Luna... Não minta.

Gabriela, esta desapareceu da minha vida por completo quando acabaram-se os anos de colegial. Suas saias curtas, seus cabelos sempre de uma cor diferente... Aquele ar de tédio e imortalidade com o qual ela olhava a todos. Um charme, um senso de sensualidade que apenas Dorian Grey conseguiu conquistar, por efeito das palavras de Wilde. Ela era imortal, mas não para mim. Sumiu, será se destruiu o quadro no qual sua imagem envelhecia? Como ainda somos jovens, provavelmente o que ela escondia no quadro eram seus momentos de tristeza e desespero que se passavam apenas do lado de dentro daquele fantástico corpo pálido e enfastiado... Sumiu, infelizmente.

A minha querida senhorita Raquel se mudou para Porto Alegre... Como eu gostaria de reconquistá-la, exatamente como a conquistei antigamente. Com os conselhos de um amigo galã. Nunca fui galã, nunca precisei; só precisei e preciso de conselhos.

Preciso de Luna. Luna é a única que me resta, mas o que fazer? Devo ir à sua casa e implorar que me deixe entrar, que fale comigo, que me perdoe? Não, não seria nada sexy. Ou talvez ela ache sexy, ela e seu jeito de dominadora, sempre por cima. Em todos os aspectos.

Luna, olhos azuis, loira, quente quando quer, fria quando quer, senhora de si. É mulher demais para mim, eu acho... E para qualquer um desse século. "Alguns homens nascem póstumos", disse Nietzsche. Bem Luna não é homem, mas nasceu póstuma; mesmo assim ainda preciso dela. Morrerei, é o único jeito, juntar-me a ela e seus versos no futuro glorioso da humanidade que ela defende. Lembro-me que quando estávamos juntos ela havia me contado que havia pensado certa vez em se suicidar como Werther, o famoso personagem de Goethe. Suicídio nada original, pois muitos o cometeram após ler o livro na época em que foi escrito. Mas enfim, acho que se me matasse como Werther de algum modo eu a impressionaria... Luna, vou morrer por você, pois sei que você não vai morrer por mim nem por ninguém. O sentido da minha vida... Da minha morte, aliás.

Agora a 5ª sinfonia é mais ideal. Você, Luna, vai ler este meu texto, esta minha crônica; vai ver que morri por sua causa, ouvindo as músicas que você aprecia, por causa dos seus livros e das suas idéias. Você é maléfica, Luna, e gosta disso. Pego meu vinho Casillero del Diablo, bebo na garrafa uma longa golada. Acendo uma vela em frente ao computador. Tiro a arma de dentro da gaveta, e agora minha alma é sua. Vendo minha alma a Mefistófeles, como Fausto. Você é meu Mefistófeles, querida. Seu Goethe, seu Beethoven, seu beijo naquela noite, seus textos por todas as outras noites. Adeus.