Sol de meio-dia

Ao barulho de lata que veio da parada, não dei muita atenção. Minha atenção voltou-se para o homem que produziu tal barulho, ao terminar sua cerveja. Estava sem camisa, cabelos loiros desgrenhados; levava nada além que a camisa em suas mãos e um violão, olhava para o final da L2 sul como se fossem terras nunca descobertas. Seu olhar era fascinante: louco, bêbado, visionário e cheio de impetuosidade. A esta altura já havia me sentado ao seu lado, na parada do ônibus. Era meio dia de um lindo dia completo, a iluminar-nos ambos.

- Será que a vida é só isso...? Disse o homem, olhos ainda fixos no além.

- É sim, respondi prontamente. Só é preciso aproveitar "isso" ao máximo. Curtir...

- Curtir, ele repetiu, um pouco desolado. Mas é tão injusto!

- Nada podemos fazer, no entanto, para tornar justo. Devemos tirar proveito da vida como ela é.

- Só uma família pra estruturar um cara... Mas o deixa tão preso...

- Tudo tem suas vantagens e desvantagens, né? Cabe a nós ponderar e escolher. O homem está condenado a ser livre, disse um filósofo.

- Condenado a ser livre, repetiu o rapaz, se agachando e olhando para o chão, como se ali morasse o segredo da vida. Foram uns 5 segundos de reflexão semi-profunda. Drogas, sexo, esporte, comida e bebida, continuou. Quais você usa?

- Todos, com muita moderação...

- Tá certo, né, tem que ter controle. Vem meu ônibus, tchau procê que fica! Pegou seu violão desastradamente ao mesmo tempo em que vestia a camisa.

Meu ônibus veio em seguida; quase não o vi, devido à forte luz do Sol em meus olhos.