O amor, um lugar comum

O amor é um lugar comum. Sim, a julgar pela falta que ele faz a quem não o tem. Parece que a sua falta é a maior inspiradora de poesia do que a sua presença. Pois toda presença é inefável, a começar pela presença divina. Sem querer, o foco dessas mal digitadas linhas começa a se alterar, e migramos do amor e sua falta para a presença e sua inefabilidade. Sim, quem ama não fala, quem ama desfruta do amor, enquanto ele se desenrola, num presente contínuo e sem fim.

Até que... se acaba. Ah, que saudade! Logo estaremos fazendo poesia, escrita, falada, televisada, poesia a cores ou em preto e branco, poesia cantada e ilustrada. E a poesia alimenta a falta de amor que alguém, ansioso e sequioso pelo mais espetacular sentimento humano, o amor, com uma pálida descrição do que seja o amor.

Dizem que o grande inventor do amor foi Shakespeare. O seu “Romeu e Julieta” inspirou muitas gerações, um amor que desafiava as tradições e superava as diferenças entre clãs inimigas, um amor que se realizou plenamente com a morte. Julieta se mata quando crê que seu amado morreu. Este, ao despertar do manto negro da morte, verifica que Julieta está, e fato morta e dá cabo à vida. (ou será que foi o contrário?) Bem, isso é o amor, para Shakespeare, algo que impossibilita a vida, caso o objeto do amor não mais exista

Pois foi um antiamor o que fez com que um pai descontrolado atirasse o corpo desfalecido de sua filha de cinco anos pela janela abaixo: ao julga-la morta. O que fez ele ao ver a sua querida Aída ao chão inanimada? matou-se por amor, como Romeu? Não, defenestrou-a e completou o ato vil e ensandecido de desamor, lançando-a no espaço escuro da morte.

E o amor continuará a ser um lugar comum, desejado por todos que se submetem, de bom grado, a armadilha que a natureza criou para garantir a reprodução das espécies.