Caro Protetor Solar,

Você sabe que eu não gosto nem um pouquinho de você e sei também que você nem liga, pois conheço a força que você tem. Há quem goste do seu cheiro e há também, parentes seus que tem um perfumezinho mais saliente que o você.

Escuta aqui, seu branquelo, acha que é bom sentar na areia da praia com você incrustado no meu corpo? Na praia, você é a estrela e o salvador, mas entrar no mar com aquela crosta branca nas costas, na cara e no peito não é nada confortável. Você tem o dom de fazer as coisas grudarem nos outros. Seja ela o que for.

É deplorável achar que todo mundo vai ficar com sua cor. Isso é egoísmo. Tenho certeza que você tem um pacto com o buraco da camada de ozônio. Você só é vendido porque ela existe, e se não passar você, é aquele ardido e vermelho. Isso é um complô!

Mas, lhe garanto que é ilusão sua que as pessoas ficam se lambuzando de você. Acha que todos passam nas dobrinhas das orelhas, nos vão dos dedos, nas pálpebras e nos lugares mais obscuro do corpo: está muito enganado.

No máximo, passam na hora de sair de casa, uns pinguinhos nos ombros, na bochecha e nas pernas. Você é o terror das praias, que por ser um local público, todos tem o azar de compartilhá-lo quando entram na água. Até na sua forma mais vagabunda, até seu tubo mais caro da perfumaria.

Saiba que nem sempre você é bem vindo. Vai num clube ou numa piscina para ver se você entra. Já na portaria está uma placa: “Proibido o uso de protetor solar”. Se todos fossem educados não o passariam no banheiro e não teríamos a infelicidade de vê-lo boiando nos cantos das piscinas.

Há poucos dias vou a praia e você pode ter certeza: não vou passar nem se quer uma gota sua em meu corpo. Você vai ser ríspido, vai ser meticuloso. Vai me deixar todo ardendo e com dificuldade para dormir, mas em uma coisa você se engana: eu não vou ficar pálido assim como você.

Ah! Não me venha com disfarces baratos. Confesso que uma vez você me enganou quando estava transparente em forma de gel, mas me fez a mesmas coisas que faz em sua forma branca: me melou inteiro, me fez sentar na areia e pensar que nada iria acontecer. Traiçoeiro.

Fora isso, me disse que se eu entrasse na água, não precisaria mais passá-lo novamente. Quando falou isso, até me simpatizei com você, mas você é mau-caráter, tem um “quê” de maldade na sua fórmula e mais uma vez me enganou. Resultado: Fiquei mais vermelho de que meu sangue.

Enfim, prefiro ficar à pururuca a me lambuzar de você e me sentir até um pouco mais pesado de areia. Nesse finzinho de calor, se depender de mim, você vai ficar embolorando na prateleira enquanto eu vou ficar de baixo do guarda sol, que é mais confiável que você, tomando uma cerveja bem gelada.

Diego Mendes
Enviado por Diego Mendes em 28/04/2008
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