O Vendedor de Pirulitos

Pensa que não? Vender pirulito é uma arte.

Fabricar tambem. É como dançar uma valsa!

Tem que ter o ponto certo, o papel certo para servir de embalagem, e ainda a banha de porco sem sal para lubrificar, senão ele agarra, suja os dedos, e o cliente xinga a mãe do vendedor.

Joaquim então resolveu montar a maior fabrica de pirulitos do vale do Rio Doce!

Comprou dois tachos de cobre, cem formas de latão, duas colheres de madeira, vinte quilos de açucar e anelina, e uma táboa redonda, furada com cem buracos e o pau para servir de suporte e mostrar o produto final, e sair pelas ruas para ganhar uns trocados: Parecia carregar um guarda chuva coberto de cristais de todos as cores.

Vender pirulito é uma arte!

Joaquim da dona Zilda esqueceu que tinha um corrimento nasal crônico: Amarelo, viscoso, encorpado!

Este detalhe, levou-o à falência.

Sempre catarrento, e limpando a mão na bainha da calça, quem iria comprar aquele pirulito catarrado?

Os vendedores de quebra-queixo foram à loucura!

Eram financiados por um dentista que se instalou na cidade e era proprietário da única fabrica.

Vendia o seu doce barato, só para ter o retorno na frente, consertando dentes abalados, obturações arrancadas e dentaduras arrebentadas. Os dentistas faziam a festa!

Por outro lado, o vendedor de pipocas também quebrou.

Tinha um ponto em frente ao "Cine Ideal", e nas tardes de domingo, no campo do Nacional.

Só vivia coçando o rêgo! Quem iria comprar pipocas com resina de bunda?

Foi quando por lá apareceu um tal de Matozinho. Opilado, aguado, sobrevivendo com leite de égua, para curar o aguamento.

Uma bela tarde de São João, resolveu soltar uma bomba "Cabeça de Nêgo".

"Deu um preto", e a bomba explodiu na mão esquerda.

Bendita Bomba! Mil vezes bendita!

Ao curar-se, o que sobrou da mão ficou parecendo uma raiz de gengibre.

Como tinha que ganhar a vida, deu uma bicicleta na fabrica desativada de pirulitos, ainda voltou uma cigarrinha de bico amarelo, e um "pião garrafinha" de peroba do campo. Coisa rara!

E lá se foi o Matozinho "Mão de Gengibre" ganhar rua, sorrir para a criançada e contar piadas para alegrar as pessoas.

Do leite de égua, passou a comer feijão com carne sêca. E foi bordando sangue na cara e saliva na boca.

Ganhou força e músculos, carregando o tabuleiro de cem pirulitos. Parecia um porta bandeira levando um estandarte. Orgulhoso do seu trabalho.

Rodava a cidade de ponta a ponta, ainda ia esperar o "Rápido" das oito horas, para vender seu pirulito na estação, lugar onde se reunia as pessoas para ver a passagem do trem.

Ia findar o dia, no "Cantinho do Céu", nos braços quentes da "Véia Jove", se arrastando de amor.

Até o cabelo ganhou brilho, e a alegria verdadeira passou a fazer parte da sua vida.

De longe se sabia da sua presença.

Sempre trazia a felicidade, com as suas brincadeiras, e sua vontade de viver.

Era o ídolo da criançada, e o simbolo do rapaz de bem.

Dizem que está muito rico, criando boi de raça em nova jersey.

Hoje é domingo. Que tarde monótona, cheia de melancolia!

Ninguem para anunciar: Olha o pirulito!

E nem o sino do vendedor de quebra-queixo para me acordar desta letargia, e das coisas que vale a pena ter na boca, para adoçar a lembrança.

Fecho os olhos e ouço das entranhas da minha alma de criança:

Olha o pirulito! Olha o pirulito!! Olha o Pirulito!!!

O quebra queixo! O picolé de cereja!! A pamonha de Milho!!!