discurso de casamento II

Caríssimos amigos, queridos afilhados.

Quando escrevei este pronunciamento não sabia se deveria dizer bom dia, boa tarde ou boa noite. Mas, como diz o poeta missioneiro, bom dia conforme as horas que são.

Não se preocupem com o número de folhas, a fonte é 18. Descobri que quanto mais velho mais papel se gasta. Meu consolo é que ainda não retomamos as fraldas.

Sejam muito bem findos ao Pau Fincado. Já são dose anos de sítio. O primeiro casamento. O tempo passa. Estamos pensando em renomeá-lo, Sítio do Pau Mole.

A pedido digo algumas palavras nesse momento. Começo acalmando os mais novos afilhados, meus compadres, que não temam, minhas consultas as casas Goulart, Machado, Clasburg e Niketenko, foram infrutíferas. Tentei contatar o Edward Snowden, mas os americanos interceptaram minhas investidas, portanto há pouco a revelar de nossas crianças.

O Compadre Luizinho, conheci a menos de 10 anos num almoço na casa de um colega. O que nos aproximou foi sem dúvida as escolhas comuns. Ele gosta de mulher eu também. Foi o primeiro caso, e deve ser assim entre homens, em que os iguais se atraem. Uma trajetória de mais de 10 anos que nos coloca como amigos, raros que são, de mijar junto.

Minha comadre por outro, foi a mais bela das recentes surpresas, num final de semana, aqui mesmo nesse local, final de tarde frio, um jantar, e um gosto imensurável por um bom rabo. Uma garrafa de vinho branco, portuguesa, uma amabilidade e um carinho próprio de filhos, acompanhada pelo compadre Luizinho que parecia um ganso novo. Eram uma alegria só.

Por conta da Isis, esse encanto de menina, nossa afilhada, aproximamos muito nossas famílias e nosso conviver. A amizade e a convivência verdadeira, pura, nos importam, mexem com nossa rotina. É um privilégio de ter a Cristiane e o Luizinho tão próximos. Aí chego na Julia, nossa mais nova afilhada.

Me apresentaram a essa alma menina como uma porto-alegrense. Quero aproveitar esse momento, na presença de grandes autoridades familiares, civis e religiosas, para registrar minha insatisfação com esses antigos costumes. Se as corretes religiosas das mais diferentes vertentes pregam que o nascimento se dá na concepção, dado que o aborto é crime, essa menina não deveria ser reconhecida como porto alegrense senão a primeira e única, até onde eu conheço, Pau Finquense de nascimento. E ainda não fiz minhas contas mas estou pra dizer, que foi na noite do rabo, regado a vinho branco.

Nessa deliciosa convivência com a Criz e o Luizinho vim a descobrir, que essas almas prometidas já haviam se cruzado na adolescência. Mas assim como o aço precisa de tempo e fogo na medida certa para dar liga, não era o momento certo para esse acordar. Segunda minha comadre porque o compadre era chegado num peito, o que lhe faltava na adolescência, por outro, sabemos que o guri na flor de sua juventude gostava mesmo é de um bom jogo de futebol.

O Despertar do Luizinho, para coisas outras, segundo sua mãe, foi decorrência de uma consulta médica com um Proctologista. Conta a Clarice e o Jorge confirma, que retornado da consulta, na mesa familiar do almoço, questionaram o Guri sobre o encontro com o dito profissional e seu diagnóstico, se havia mostrado o ... para o médico enfim, essas coisa que os pais perguntam aos filhos. Reapresentando a situação ocorrida no consultório, dizem que Luizinho levantou-se, abriu a braguilha tirou o distinto pra fora, deitou-o sobre a mesa, com um sorriso de orelha a orelha se pronunciou: Que tal o exemplar Doutor!!!!

Bom, com o passar do tempo, conhecedor do ocorrido, um dia não me contive. Contei o fato a minha comadre que Profetizou: Menos Fernandinho, bem menos, durinho mas oh!!!! (Mostrando com os dedos um pequeno tamanho). E como eu sei que mulher não mente, acreditei na comadre.

Aproveitar esse solene momento e dizer a esse lindo casal que a regra num casamento é ser feliz. Ser feliz fazendo o que é preciso ser feito. Ser homem, ser mulher, profissional, competente, dono de casa, companheiros, cozinheira, lavadeiro, conselheiros, arrumadora, curador, mas fundamentalmente fazendo o que é preciso ser feito. Não fosse assim todos seriamos boêmios e poetas, ou na pior das hipótese um candidato no programa mais médico da Dilma.

Viver aceitado essa metamorfose ambulante que somos. Não há uma verdade só, única. O que existem são verdades possíveis. Admiradas e questionadas equilibram-se na balança de um acordo. De tempos em tempos, construindo avanços e retrocessos, essa balança pende. E deste movimento se ampliam os horizontes, sepultam-se verdades, e a humanidade apreensiva avança, por outro sorridente, retrocede aplaudindo a criação.

Falar nesse momento é lembrar do amor. Dizer que é a mais difícil das partilhas. Não se amealha tão pouco se esbanja. Sua justa medida está entre doar e receber, na exata proporção. Difícil apreender essa dosagem assim de cara. Uma escola, a mais rara, é praticar, se doando sem se dar, possuindo sem ter, dia a dia da manhã ao anoitecer.

Afilhados, estão iniciando um tempo de troca, de empréstimos, recíproco. Versar sobre esse tempo, hoje abençoado é um diálogo que se inicia e vai longe até seu encerramento. Diriam:

Vai, me emprestas as mãos! Pelos seus dons irei tocar. É mais do que amar poderei sentir pelo tato, os fatos a relatar.

Me emprestas teus ouvidos. Quero ouvir alaridos. Os sons e tons que envolvem meus sentidos. Sortidos são todos bem vindos, emanados como dádivas.

Me emprestas teu cheiro. Melhor, corrijo ligeiro, teu olfato. Pelas flores, pelas comidas, pelos perfumes e os dia a dia de bons tratos.

Ha! Seus tatos delicados. Me empresta teu ser, teu querer, teu sentimento. Te juro, devolvo, não lhe absorvo. Só quero por um momento.

Ha! Teus olhos, arregalados, faceiros, arredondados, ligeiros. Por um minuto, discretos resolutos. Me emprestas para ver novamente. O que deveras vivera no passado, somente.

Depois deste empréstimo, o tempo decorrido, te abandonarei. Seguirei como sempre segui. Tudo o que persegui do mais puro ao ingênuo. O dever de ser pequeno, mesmo antes de existir.

De ser impuro por persistir. De ser ignóbil e sem cheiro. Sorrateiro tal nevoeiro, Sem nenhuma saudade de ti.

A recíproca será verdadeira. Numa nevoeira sem fim. Deixar-nos-emos eu e você de mim. Para sempre, como decisão derradeira.

Minha alma, tua alma. Lugares distintos como esquinas de um labirinto. Sem vontade de encontrar-se. Sem vontade de partir.

Para finalizar, gostaríamos de desejar ao casal. Que a convivência seja intensa e saudável. Que não percam a capacidade de se indignar. Não construam muros, divisas, tapumes. Se houver necessidade de estabelecer limites, plantem flores enfileiradas. Nossos pais sempre foram muito bons nisso. Façam a diferença, sejam jovens daqui a 30 anos. Tomem banhos todos os dias. Amem. Não comprem fiado. Não assinem promissórias. Que os compromissos sejam selados com beijos. Lembrem temos duas orelhas e uma só boca. Telefonemas não substituem visitas, as pessoas ainda precisam ser tocadas. Sejam sustentáveis, consumam produtos locais. De preferência para os não industrializados. Sabugo não é só matéria orgânico, pode substituir o papel higiênico, mas só o papel higiênico. Evitem de ir muito seguido a Campinas, para não falar mal de Pelotas. Leiam livros. Não andem pelado em público, sem roupa no público só estátua. Visitem seus pais avós e irmãos, tios, seus familiares, regularmente, é um pé no saco, mas família ainda é a melhor das referências. Cuidem dos mais velhos, aprenderão a ser cuidados. Não crie gatos, pois você cairá na tentação de abandona-lo. Não votem em branco. Respeitem os limites, dos outros, de velocidade, dos velhos, dos homens, das crianças, do cartão de crédito, da política, do governo Tarso. Sejam criativos, estejam onde estiverem, mas bom senso é imprescindível. 20 de setembro acorde cedo, faça um mate, leia a Classe Operaria, cante o hino esteja onde estiver, pois afinal o Rio Grande se carrega no peito.

Felicidades a todos!

Pau Fincado, 22 de fevereiro de 2014.