Dueto com Alberto Caeiro - Fernando Pessoa 

O guardador de rebanhos


O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,


     Meu olhar é límpido como a chuva até a porta
     passeando pelo caminho, entre campos e cantos
     e corre em silencio, melodiando o sentido
     contornando, a sua própria forma...
     E o que vejo, revela-se um sonho
     transparência real, numa realidade distante,

E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
que tem uma criança se, ao nascer,
Repasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo...


     A ser só porque me sinto muito bem...
     com tal canto e carência
     que me vejo ao ser pássaro no chão,
     descubro tentando aproveitar o tom...
     Sinto-me a palavra que ainda não nasceu
     um grito, sem nenhuma forma de voz...

Creio no mundo como um malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O mundo não se faz para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...


     De certo eu vejo o mundo como sendo o amor
     como também acredito que ver é sentir
     porque sentir a verdade é enxergar a si mesmo...
     A plena aceitação de que compreendemos a vida
     é ver-se iluminar o princípio de que somos
     crianças ainda a brincar e buscar entendimento...

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar...


     Que por ser vida, é breve cada momento...
     Absorvo cada amanhecer, porque sei estar vivo
     e amo cada segundo quando meus olhos se abrem,
     porque eu amo, ou seja, a própria vida
     pelo motivo que sinto, tranquilo em amar...

Amar é a eterna inocência,
E a única inocência não pensar...


     Amar é o ponto do equilíbrio,
     pois que digo que sentir, é a alma a olhar...

Chagas Neto e Alberto Caeiro
Enviado por Chagas Neto em 06/02/2013
Código do texto: T4125537
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.