Luz de Inverno

Talvez ter visto Luz de Inverno, de Bergman, nesse final de ano não tenha sido uma boa escolha. Justamente numa época onde todos pregam uma visão positiva de mundo, uma renovação da fé, uma renovação dos ânimos, um chamado para lutar contra as atrocidades que nos rodeiam, o filme vem contra tudo isso. Luz de Inverno não é somente uma reprodução do esfriamento da fé, pior: é o esfriamento do amor (como visto nas cenas de Ingrid Thulin com o pastor Tomas) esse sentimento tão frugal e fugaz nos dias atuais, onde todo romantismo e seus adornos são desmistificados. Sem fé e sem amor nos vemos sozinhos num mundo ameaçador. Ficamos em silêncio. E não é à toa que a obra faz parte da trilogia homônima.

Gostaria de ter forças para lutar contra essas idéias de desgaste, mas elas parecem tão fortes que, quando menos imagino, lá estou eu exercendo minha parte nesse mundo em preto e branco, assim como o sueco o filmou; lá estou praticamente militando em prol do conceito do fim do amor, a falta de fé nele, estou praticando o desamor... Ao mesmo tempo em que sonho viver um amor eterno com a garota que acabei de conhecer. Só que sei que não terei isso. Talvez não tenha nem mesmo o começo desse relacionamento amoroso, o que de alguma forma seria interessante, pois geralmente o amor não consumado, digo, não continuado, só esperado, gera aquela imagem de eterno. Se Julieta tivesse descido do balcão tudo teria sido diferente e provavelmente a peça de Shakespeare teria acabado como o Mercador de Veneza... No tribunal e com advogados pelejando. Sei lá, acho que os únicos amores pelo que se valem a pena morrer são os platônicos.

Não milito em favor do fim da fé pois acho demasiado cruel (mas sei que ela definha no mundo moderno), além do que não perdi a minha inteiramente, só a reformulei, ou tento reformulá-la, como o personagem de Gunnar Björnstrand. Acho que não sou tão super-homem assim, não tenho sangue ariano correndo nas veias de minha alma para conseguir encarar a vida sem Deus, apesar de acreditar na moral “auto-regulatória” do homem, ou seja: o homem pode ser decente mesmo sem crer em Deus.

Mas, em algum momento de esquecimento ou desespero, me levanto e luto contra essa solidão e esse ceticismo, é como se fosse instintivo, quebrar meu estoicismo. Como podem ver, tudo é um ciclo ambíguo.

Agora, se vocês me dão licença, vou ouvir Muse e cortar os pulsos.

Tenham um feliz ano novo... Se conseguirem.

Otto M
Enviado por Otto M em 03/01/2009
Reeditado em 29/04/2010
Código do texto: T1364681
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2009. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.