O Cosmos, o Caos e o Axioma.

A inquietante prisão racional, talvez seja a mais absoluta condenação experimentada pela raça humana.

Quem somos?

De onde viemos?

Para onde vamos?

Esta espiral de incertezas, como uma grande esfinge nos persegue, e ainda hoje, embora disfarçada de alguma sofisticação, prevalece

como a mais soberana de todas as questões.

Quem é o homem?

A ciência, a teologia e as intuições primitivas buscam uma conexão entre a nossa realidade e a nossa finalidade. Dentre seus expoentes, todos que se possam chamar de pensadores, sejam filósofos, sociólogos, economistas, teólogos e até em muitos casos juristas, nada mais faziam senão interpretar a ordem e alinhá-la na forma do seu convencimento para atingir um equilíbrio estético.

As sociedades na forma como as conhecemos e estudando suas variações, evolução e declínio; podemos constatar a imobilidade de propósito, ainda que passado milênios. Continuamos buscando aceitação e imortalidade, não conseguimos abolir nossas vocações individuais e estabelecer uma identidade coletiva, seguimos por avanços esporádicos em movimentos sobre os quais não exercemos nenhum governo. O que os movimentos modernos proclamaram utopia, traduz-se, textualmente, como lugar algum.

A lógica é o artifício para atestar nossa insignificância. A física quântica, a matemática e quaisquer das ciências ditas exatas surgiram para constatar a nossa escala atômica, a ínfima significância que temos diante da plenitude do sistema a que pertencemos.

Condenados ao caos, tal como víamos as antigas civilizações diante dos totens e deuses tentando aplacar seus medos e ocultar da consciência seus implacáveis destinos.

Vítimas do cosmos que somos uma vez vencidos pelo tamanho e pela importância nos atamos de maneira atávica a crença que somos os comandantes desta nave, quando a imponderável realidade nos ignora e nos condena a uma ilusão de passageiro. Vertigens e fantasias alicerçam a nossa teogonia surreal, se faz necessária a criação de uma realidade aceitável, onde sejamos os heróis e ainda que de forma desconexa imaginemos que dirigimos nossos destinos.

A Cosmogonia romanesca tem estofo historiográfico, brilho de ciência, quando não passa de fogueira e espantalho para aplacar medos. Todos os avanços se sustentam dos fragmentos fantásticos dessa falácia.

O que melhor sustenta esta realidade fabulosa é a forma como compactuamos para ver esse mundo, pelos olhos da arte ou pelos olhos da ciência. Criamos as leis que irão validar nossos atos e nossos excessos, excluímos os que nos confrontam, elegemos estados de consciência e normalidade, definimos credulidade e incredulidade, acreditando que esta exposição dicotômica pudesse nos remeter a algum equilíbrio, vez que a justiça se faz necessária nas relações de domínio e submissão.

Assim está criado o axioma, que não admite especulações e flerta com o autoritarismo do conhecimento e a arrogância das cátedras. Neste ponto torna-se necessário estabelecer uma conexão menos ideologizada da nossa relação com o conhecimento; hoje vivemos a racionalização como alternativa ideal, recusando as opções que nos constituem e que, talvez, por não se adequar a determinados conceitos, não faça parte do elenco de atributos consagrados nas relações reais.

Realizamos um esforço muito grande para promover as virtudes antes mesmo de entendê-las, concomitantemente, depreciamos o vício numa simplificação de certo e errado que não proporciona um real entendimento da nossa constituição, seus antagonismos e contradições. Não conjeturamos sobre os extremos, o quanto de generosidade compõe um perdulário e o tanto de avareza contida no parcimonioso.

A dificuldade está em aceitar o preconceito, no seu sentido lato, como parte do processo de formação de conceito e matriz de idéia.

Ao conjunto de valores que pretende dar alguma coerência ao contexto criado pelos protagonistas destas relações, a infraestrutura com seus valores e signos, nominei estética que nada mais é que o conforto para uma relação desequilibrada.

Aos que não cabem nas salvaguardas concretas do mundo ideal, prometemos um mundo de venturas na vida dos mortos; aos que gozam dos privilégios que esta ordem é capaz de proporcionar prescrevemos discrição e parcimônia, para não desmontar o arranjo que serve de estamento para esta sociedade.

O poder ainda é uma relação de ter, e se apresenta pelo livre convencimento que ao abrir mão de uma determinada aptidão em favor de alguém, estaríamos trocando, mas também podemos dizer que estaríamos servindo. O exercício do poder ainda nos é obscuro, vez que não enfrentamos a sua natureza dolosa e coercitiva. Como ferramenta ele somente se faz valer pela submissão a uma vontade, qualificada ou não, enfrentada a coerção como uma relação de inferioridade ou mesmo de incapacidade.

A estética e a ordem que a consagra auferem aos seus eleitos uma referência e uma relevância que permitiria que mesmo argumentos desprovidos de medida viessem ser acolhidos no seio deste fragmento da sociedade. A palavra real que torna um o preposto dos demais.

Na história da humanidade não há registro de fatos pelos povos subjugados. O que nos permite colocar que a história, tal como ela é descrita, nada mais é que uma versão original e oficial, dentre todas as versões possíveis. Assim, vemos os fatos se repetir em narrativas que ora valoriza uma vertente em detrimento de outra e segue adiante.

A realidade é que a história não conta seus mortos, a não ser para evidenciar um novo ângulo de uma imagem sem perspectiva.

Os instrumentos que temos e o conhecimento que constituímos são de valia questionável para o propósito definido, porém não confrontamos o exercício e assimilamos os seus resultados, referendando como ciência os desvarios da especulação.

A grande entidade que a nossa desimportancia soube tão bem deduzir traz em si nosso esplendor e a nossa derrocada. O cosmos com a sua ordem tão perfeita e tão harmônica que nos infla de inveja, e a tudo que chamamos de gênio e invenção, poderíamos de maneira menos pretensiosa chamar de descoberta.

É a perfeição e grandiosidade do cosmos que almejamos, é essa transcendência atemporal, essa selvagem infinitude que perseguimos.

Imaginado em dimensão, qual seria o tamanho do Universo?

Qual a relevância das nossas inquietações?

Chegamos numa encruzilhada, caminhamos agora, como sempre, sem direção e desconhecendo totalmente o caminho. O microcosmo não nos reconhece, as partes autônomas que nos compõe, não nos auxiliam na compreensão e na formulação dos juízos. Para o microcosmo somos hospedeiros, um microverso inexpugnável, monolítico, cuja dimensão avilta e deprime.

O macrocosmo solenemente nos ignora, buscamos a luz como se nela houvesse resposta para todos os nossos medos; mas o que prevalece no Universo é a matéria escura, que é uma identidade da nossa limitação diante do desconhecido.

Esta poderosa escala a que estamos subordinados, nos impõe a realidade de que somos fração, quando aspiramos unidade e a nossa consciência autentica o quanto somos remotos e de pouca relevância diante desta sombra colossal.

Para onde vamos?

Para o vale do esquecimento medir a eternidade junto com fósseis de dinossauros, desaparecendo sem deixar traços, na insignificância de alguns bilhões de anos.