EMOÇÃO, RAZÃO E SENSIBILIDADE

Não, não quero parafrasear (muito menos plagiar) Jane Austen. Aliás, confesso, nem li seu livro – Razão e Sensibilidade – para saber exatamente do que se trata. Minha intenção é apensa falar de sutilezas.

Num primeiro passar de olhos, emoção e sensibilidade podem parecer a mesma coisa; mas não são.

A emoção é passiva. Você sente, visceralmente, prevendo ou não a ação, e a reação é instintiva. Ela é acionada por mecanismos particulares a cada pessoa, de acordo com o repertório de vida. A emoção refere-se a um estado de comportamento que ativa respostas físicas e repercute nos campos psíquicos, causando sensações intensas, seja de excitação ou depressão. Quando as emoções são extremamente fortes as funções intelectuais podem se desmontar ou se desorganizar. Ou seja, é incontrolável; portanto, excitante e ao mesmo tempo perigosa. Muito perigosa!

A sensibilidade, por sua vez, é uma via de mão dupla. Apesar de ser resposta a estímulos, também compreende a capacidade de percepção dos mesmos. Ter alta ou baixa sensibilidade depende, provavelmente, das experiências de cada ser. A predisposição psicofísica desse entendimento caracteriza os diferentes limiares desses estímulos. Ou seja, o Homem tem a necessidade de se deixar levar pelos sentimentos, porém a sensibilidade permite a ele interpretá-los de melhor forma e, assim, tomar atitudes menos impulsivas.

Então, pratique a sensibilidade e alivie um pouco a entrega irracional às emoções.

Por falar em irracional, você pode estar se perguntando por que eu não incluí a razão neste ensaio ainda. Pois farei isso. Só deixei para o fim porque tenho tendências radicais (que não aconselho a ninguém ter) favoráveis sobre este conceito. Mas o fato é que busco pegar mais leve sobre o assunto porque começo a chegar à conclusão (de difícil aceitação, admito) de que tudo é mais bem respondido no meio termo.

Tudo aquilo que é vivido à flor da pele é nocivo. É como uma droga, que no início parece mágica, insuperável, mas que, ao mesmo tempo, te entorpece, cega, descontrola e causará overdose mais cedo ou mais tarde. Todavia, o oposto também tem seus males. Tudo o que é feito à extrema racionalidade renega a essência humana que (por mais que eu ache que ela deva ser levada cada vez mais sobre o prisma da lógica) envolve o sentimento.

Portanto, até que se prove o contrário, a sensibilidade é a chave.

Só que não é fácil calibrá-la. Pois para tal, é preciso deixar uma outra característica própria de nossa raça de lado: o egoísmo. Temos a tendência de calcular tudo sob a nossa ótica. As emoções que os outros nos causam não partem necessariamente dos outros, mas sim do nosso universo interno. Os fantasmas estão dentro de nós, só são libertados pelas ações alheias. Por este motivo a emoção nos domina além da conta. Porque projetamos as respostas que queríamos dos outros de acordo com o nosso bem-estar. Não paramos para pensar que vivemos, agimos e pensamos independentemente.

Dia desses, metaforizei para um amigo as ações individuais comparando-as a momentos histórico-sociais. O maniqueísmo emoção X razão é manifestado nas mudanças de Eras. A Idade Média foi toda emoção, toda fé, nada racional. Por isso, absurdamente cruel. O Iluminismo, por sua vez, trouxe a visão científica, cartesiana, racional, que libertou espíritos de maneira mais eficaz do que as fogueiras da Inquisição. Porém, não se posicionou como única premissa, pois a busca por resultados é eterna. As respostas de hoje não são as mesmas de amanhã, pois, se assim fosse, o Homem pararia de buscá-las e estancaria.

E por que nossas respostas e, consequentemente, ações mudam?

Porque nos relacionamos. E não são relações meramente biológicas – algo que fica evidente no fim do século 19, quando surge a necessidade de se implantar as pedras fundamentais das ciências sociais. Se fosse tudo meramente biológico, talvez, tudo fosse mais fácil... e mais chato, pois não teríamos entendimento. E é aqui que está a beleza: temos entendimento. E é por isso que critico tanto a entrega cega à emoção, porque ela quebra essa compreensão das coisas. Uma compreensão que, aliás, transcende à razão... Explico.

A razão seria a resposta final se não tivéssemos criado algo que somente nós, seres humanos, temos neste planeta: cultura (em todos os planos da palavra). Só passei a – chegar perto de – compreender isso quando, em uma noite dessas qualquer, ao tentar explicar, com voltas e mais voltas, o que fazia da vida para uma moça, ela me disse: “Então você é um artista”. (quem diria, hein?!)

Enfim, não devemos viver a plenas emoções e nem podemos explicar tudo pura e simplesmente pela razão – haja vista Mozart, Picasso, Fernando Pessoa... –, mas podemos tentar compreender e apreciar as coisas perfeitamente sob a ótica do entendimento humano. Contudo, isso só acontece plenamente se feito sobriamente, sem a interferência embriagante da emoção rasgada e sem a chatíssima e reta busca por respostas exatas.

Respostas essas que, definitivamente, não estão neste texto.

mais em www.cronicasdobeto.blogspot.com