Secura
As portas de entrada, todas escancaradas, e nenhuma fresta de saída. Como armazenar tantas informações, e segurar tantas incertezas? Entre um amanhecer e um começo de madrugada quanta vida correndo ansiosa, tanta prosa sem conversa e tanta conversa sem pressa.
Bastaria um dia de diques abertos, pra vida escoar livre e esgotar em si só, bastaria um estalar de dedos e as comportas fariam gerar energia capaz de iluminar a cidade, mas a vida continua apagada atrás da chama que oscila, entre um sonho e uma promessa.
Quando fechado em si estão os sentidos todos e nem uma oração, por mais bela que seja, parece surtir efeito, morre um pouco a canção que livre rola pelas quatro paredes, a mesma que ganha os ares da noite e vai ao infinito trocar confidências mudas com a pureza dos astros e a ternura dos acasos.
Há muito o que plantar ainda nas estradas sem prumo, e muito pouco pra se esperar pra colher, medidos como sempre foram em mãos generosas; que pena, não se soube contar em anos aproveitáveis o exercício da experiência.
Escondida atrás dos rabiscos tolos e das horas desgraçadamente caiadas nas mesma portas e paredes, lá se foi a inútil juventude. Diante do espelho a vida pode sorrir sem constrangimento, mas diante da secular secura de palavras;
só a clareza do silêncio pode provar a crueldade, como se fosse ela a única verdade.
Atrás da vidraça não se pode sentir o calor do sol...