Primeiras  Impressões
                                    (texto em construção)

          1 - A Saudade
     Anáfora (consiste na repetição de uma mesma palavra no início de versos ou frases).
     No caso, “A saudade é...”
 
     
 
          2 - "'B. FAWKES" não está disponível para bater papo."

      Presença da anáfora.

      "'B. Fawkes" não está disponível para bater papo."
      In casu, a anáfora revestiu e prolongou a força da mensagem, que se projetou através das camadas da sensibilidade do leitor, transformando-o de espectador em cúmplice - funcionando como um lamento a mais, um ai elegíaco.
   
   
    
          3 - Conceda-nos Deus
      Transcrevo, para os devidos fins, o poema:
               Ah, Deus, conceda-nos
               A sorte de só viver,
               Todos os dias,
               Até o final
               Com alegria
               E acordar
               Mais uma vez!

               Ah, Deus, que ampara e cria
               Com Sua Graça
               Conceda-nos, sim,
               A alegria
               De muitos anos,
               Muitas velinhas,
               Muito viver...

               Ah, Deus, ouça-nos bem,
               E não nos prive
               De convivermos,
               Estarmos juntos,
               E celebrarmos
               A própria vida
               Que concedestes!

               Ah, Deus, aqui ficamos,
               Olhando a estrada
               E esperando
               Que além da curva
               Só haja...

                             
             ***       

      Já a partir do título, há duplicidade de tratamento pronominal, com "(vós) concedestes" conflitando com os restantes verbos:
     "Ah, Deus, conceda-nos"  (verso 1 - 1ª estrofe)

     "Conceda-nos, sim" (verso 3 - 2ª estrofe)

     "Ah, Deus, ouça-nos bem"  (verso 1 - 3ª estrofe)

     "E não nos prive"  (verso 2 - 3ª estrofe)

       "Que concedestes!" (verso 7 - 3ª estrofe)

                                                   ***
      
      Figuras de linguagem:
         1 - Anáfora:

      “Ah, Deus, conceda-nos...”
 
      2 - Apóstrofe (consiste na interpelação enfática a alguém ou a alguma coisa personificada), como em:
    
"Senhor Deus dos desgraçados!" (Castro Alves)

     Eis a apóstrofe da Ana:
      “Ah, Deus...”
 

     A poetisa pede aí  o mínimo dos máximos: viver. Sua súplica representa o pavor da morte, direcionado, disciplinado numa oração/apóstrofe.
   
  
    
          6 – Consolo
      Este poema bem demonstra o mecanismo mental do ser humano, que cria, inventa, adivinha forças para sobreviver a tragédias, a dramas dolorosos, conduzindo seu espírito ao plano da razão, procurando agarrar pedaços vivos da realidade para não sucumbir também. Superação necessária à espécie.
     
    

              7 - Despedida
     Figuras de linguagem:
     1 - Antítese (consiste na aproximação de termos contrários, de palavras que se opõem pelo sentido):
     “Rios passarão por tua vida,
     Secando minhas lembranças.”

     A missão do rio sempre foi inundar, encher de água – não secar lembranças. Daí a beleza dessa surpreendente imagem.

     2 - Hipérbole (trata-se de exagerar uma ideia com finalidade enfática): “Estou te esperando há séculos!”
 

     Eis a hipérbole do poema dela:
     “Mares surgirão e desaparecerão
     Antes que saibas quem fui.”


     Ora, convenhamos: um mar surge e desaparece após milênios... E a vida humana dura anos, nada mais.  Aí houve sem dúvida um exagero verbal com fins estilísticos. Um primor. 
     
   
   
       9 - ...E nunca mais haverá uma tarde como esta...
          O texto fala em janela, cabelos, vento, beija-flor, grama, cão, tarde... Não me parece poesia, mas sim prosa inspirada em forma de versos.  O tema central é o tempo que flui, sempre, iniludivelmente, e a parte que nos toca (que fica): apenas sentimentos evocantes, somente inagarráveis saudades.
          Ana une o ambiente, o contexto, o momento à evocação do sobrinho, tecendo nessa união bonitos pensamentos. 
          Seu enunciado, uma breve anotação - sem dúvida literária - foi depois expandido em versos.

   
     
    
          10 - Em um Momento
          Eu consertaria (perdão, alteraria) a seguinte estrofe:
          “Em um momento
          Tudo aquilo
          Que tu sonhastes
          Pode dissolver-se.”

          ficando assim:
          Em um momento
          Tudo aquilo
          Com que sonhaste
          Pode dissolver-se.

     Em sua maturidade, a escritora coloca ante nós o dilema da vida e da morte, plenitude e fim, alegria e nada.
    
   
    
     
          13 - Espero que...    
      Na sua ânsia de felicidade, Ana molda um paraíso, terrestre sim, e o remete ao Espaço, como presente ao sobrinho ido.  Esse paraíso sonhado ameniza suas agonias e mobiliza sua ternura: 
     “Espero...”, 
     “Espero...”, 
     “Espero.”


     Tal a dimensão irreal da ausência.
    
    
       
          14 - Eu Não Queria
     “Verde sonho” e “Vontade branca” contêm uma figura de linguagem já clássica em todas as literaturas: a sinestesia. Essa figura agrega sensações diferentes, como visão e olfato, audição e tato...  
     No caso deste poema, Ana vai bem longe, dando voz e presença a conceitos abstratos, como vontade e sonho, associados a visão e cor (verde e branca).  Isto além da conotação semântica estabelecida pela proximidade dos vocábulos: “verdes sonhos” nos passa a noção da alegria irreprimível de viver, por exemplo; e “vontade branca”, a da pureza de sentimentos, das intenções impolutas. 
     A poetisa lhes concede, ainda, o dom das emoções intensas e profundas.

     É como se disséssemos “melodia azul”, “voz áspera” ou “luz silenciosa” (para citar um artigo da internet sobre Figuras de Linguagem, feito e refeito, já anônimo).

     
 
  

          16 - Hoje a saudade passou por aqui 
        Personificação (ocorre quando damos a coisas ou animais voz, sentimentos e atitudes próprios dos seres humanos, fazendo-os atuar num espaço mítico):
a saudade passa, ri, canta, arrasta as tranças, puxa uma cadeira, senta-se, abraça Ana...
     Bem entendido, as lágrimas do áspero chão foram quem molhou as tranças da saudade.
 “Desespero sereno” seria uma definição do estado de espírito da poetisa ao desmanchar-se nestes versos - tristeza anunciada, alegrias nômades, majestosas reconstruções do que passou, rio interior. 



          17 - Mais uma vez

          Do exposto, concluo que esse milagre é a aceitação serena dos fatos.
    
     
   
          19 – Meu Filho
               
Meu filho dorme no éter,
               Não chegou a vir a ser.

               Tem os olhos bem fechados
               De quem jamais enxergou,
               Os ouvidos bem selados
               De quem nunca escutou,
               Tem as mãos imaculadas,
               Mãos de quem jamais tocou.

               Meu filho dorme no vento,
               E canta para eu dormir.

               Tem a voz quase sumida,
               Voz de quem jamais falou,
               Tem palavras tão caladas
               Que jamais pronunciou,
               A canção silenciosa
               Como a que ninguém cantou.

               Meu filho é feito do sonho
               Que ninguém nunca sonhou.

               Tem a alma imaculada,
               A de quem jamais pecou,
               A memória encantada
               Como quem jamais lembrou,
               O coração bem trancado
               Como quem jamais amou.

               Meu filho é feito da ausência
               Da mãe que nunca o ninou.
 
                                     
***
              Antíteses:
            "Meu filho dorme no vento,
            E canta para eu dormir."

                                 
*
            "A canção silenciosa"

                        *                             
            "Meu filho é feito do sonho
            Que ninguém nunca sonhou."


          Zeugma (
elipse de uma palavra ou expressão já empregados antes):
          
Eu vim a pé; ela, de bicicleta.
          Eu cresci só brincando... Já meus irmãos, trabalhando!

          Eis os versos de Ana:
          "Tem palavras tão caladas
          Que jamais pronunciou,
          A canção silenciosa
          Como a que ninguém cantou."

          ou seja: 
          "(Tem) A canção silenciosa
          Como a que ninguém cantou."

          A série repetida de dois versos isolados sugere um leitmotiv (
*), reiterando a condição de mãe/filho e revelando um relacionamento transbordante de ternura.
          A maternidade, que Ana nunca desejou, aflorou neste poema, sublimando a ausência desse possível filho na realidade do sobrinho que partiu. Uma compensação da não-vida buscada na própria vida.
          Tenho o estranho pressentimento de que estou diante de uma produção já clássica da Poesia Brasileira, algo que agrega sentimentos e harmoniza paixões.  O tempo dirá.
          Mais ainda: ouso afirmar que
o tempo também tem algo a dizer sobre "Passos" (nº 30).    
__________
* Leitmotiv (pronúncia: laitmotíf) – palavra alemã, significando recorrência a um tema, de diferentes formas, com insistente regularidade.

    
    
    
          20 - Nadar e Morrer na Praia
          Este poema não é muito brilhante, muito criativo. Fraco em imagens e argumentos. Tem, no entanto, cândidos momentos, como os que descrevem as supremas tentativas de superação da doença, pelo sobrinho.  E ainda certas palavras que sublimizam, que encantecem um texto, como: alma grandiosa, ausência, barquinhos, beleza, brisa, esperança, gaivotas, instantes, mar, ondas, praia, promessas, sonhos... 




          22 - Nós
     Veja que a poetisa não afirma “estamos sós”, mas sim “estamos a sós”. Isso muda tudo, da solidão imemorial à companhia de alguém, ser eleito.
    
    
   
          23 - Nosso Menino
          Gradação ou clímax (surge numa série de palavras que visam a intensificar uma ideia, tornando-a "maior"; pode ser ascendente ou descendente):
     “Enquanto aí em cima, ele estará dançando
     Sem muletas, incômodos, lágrimas, dores.”


     No auge do desespero da partida final, a poetisa fala com Deus, fazendo-lhe doces e maternais recomendações.
     
   
    
          24 - O erro de quem perde
          Os bons textos atingem um ponto (ou nível) de amplidão, de universalidade, que toca a todos (nenhuma novidade nisto). Nesse toque trememos e nos identificamos e emocionamos - muitas vezes já distantes do assunto do texto, já imersos em nossas fantasias e agruras... 
     Quando Luís Vaz de Camões nos diz que 

          
"Amor é fogo que arde sem se ver, 
          É ferida que dói e não se sente, 
          É um contentamento descontente, 
          É dor que desatina sem doer",

 
suas palavras circundam nossos sentimentos, abatem algumas esperanças e libertam outras, generosamente. Em outras palavras: o soneto dele, transpondo os portais da nossa alma, conduz-nos a reflexões tão gratas quão doridas, chamadas saudades. 

     Mas aonde eu queria (conseguirei?) chegar: o poema da Ana também possui alguns momentos de êxtase lírico, que nos possibilitam a volta ao passado, relembrando sonhos, parentes que partiram, amores juvenis... 


     Essa evocação das coisas e pessoas, em certos poemas, não ocorre por acaso: só surge e encanta em versos bem escritos, o espírito em glória e letras.





          25 - O Santo & o Dragão
          Texto comum, idéias comuns, emoção rasa.  Nenhuma mensagem relevante nesta peça.  Nada que se aproveite.  Nada que nos toque, nos eleve, nos faça sentir a mínima beleza, o menor encantamento.  Nenhum ensinamento, conflito ou estranhamento.  Nem mesmo a deliciosa dor da catarse.  Ausência de música, portais, ritmo, futuro,  contemplação, reflexões...  
     Falta-lhe sim perplexidade, solo, selva, inquietações...

     Um poema sem riscos, sem refúgio, sem paixão.  Entrou aqui por engano ou descuido.  



   
          26 - O Tempo é Quântico
          Nossos sentidos possuem uma sensibilidade profunda, que aflora na onipresença dos sentimentos, que ocupam nossas mentes nos momentos que bem querem, sem qualquer domínio nosso, aleatória e involuntariamente.     
      

    
          27 - O Vento e os Sinos
          Primorosa, esplêndida realização literária. Melhorável sim, estilisticamente; porém já assim nos emociona.
 
Enviado por Jô do Recanto das Letras em 20/06/2012
Reeditado em 23/02/2013
Código do texto: T3734990
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