O conceito de "bala mágica"

O conceito de “Bala Mágica” foi criado por Paul Ehrlich, nos primeiros anos do século 20, na Alemanha, em suas pesquisas para a criação de uma droga específica para combater uma doença específica. Segundo ele, a droga era como um projétil que destruiria o inimigo sem causar danos às células saudáveis do corpo.

Desde os tempos de Pasteur as ciências da cura começaram a defender a tese de que todas as nossas doenças têm uma causa definida, que precisa ser encontrada e extirpada para que se obtenha a cura e o retorno à saúde. Pasteur demonstrou que as doenças que mais afligiam a humanidade, em sua época, tinham origem em microorganismos. Assim, bastava que se pesquisasse qual a bactéria, protozoário, verme, (os vírus foram descobertos anos mais tarde) e o remédio adequado para elimina-lo para que o problema da doença fosse sanado. Tal remédio certeiro ficou conhecido como “a bala mágica” que uma vez disparada poria fim aos males.

Em fins do século 19, Robert Koch demonstrou que a tuberculose era causada por uma bactéria, que ficou, vulgarmente, conhecida como Bacilo de Koch, colocando um fim a muito mistério sobre a tal doença de poetas, românticos, boêmios e pobres. Mas não havia remédio, além de temporadas em spas e sanatórios onde, se esperava, os bons ares e a comida nutritiva combateria a doença. No seu romance “A Montanha Mágica”, Tomas Mann descreve a vida em um sanatório para a “cura” da tuberculose, em Davos, Suíça, onde ocorre hoje o Fórum Econômico. É claro, os pobres não iam para Davos. Iriam para Porto Alegre?

Uma outra doença de “gênios” era a sífilis. Músicos (Schumann), filósofos geniais (Nietzsche) deviam a sua genialidade à doença, que na fase final, a neuro-sífilis, alterava o cérebro de modo a gerar idéias “maravilhosas”. Causada por uma curiosa bactéria de forma espiralada, uma espiroqueta chamada treponema, transmitida por via sexual, a doença, igualmente, era incurável.

Foi contra a sífilis que Ehrlich voltou a sua pesquisa e desenvolveu um produto químico, à base de arsênico, que demonstrou ser eficaz contra a doença, apesar da alta toxicidade. Um laboratório, existente até hoje, criou o remédio ao qual foi dado o significativo nome de “Salvarsan”, que apenas foi superado quando a penicilina começou a ser usada em grande escala, a partir do fim da Segunda Grande Guerra. Começava ali a bilionária industria farmacêutica moderna e a criação de balas mágicas. Começava também a idéia de patentear e ganhar dinheiro com o binômio doença/saúde, e a criação dos nomes. O “Melhoral” veio logo em seguida.

Ehrlich, o cientista, é claro, é um real benfeitor da humanidade. Ganhador do prêmio Nobel em 1910 goza até hoje do reconhecimento dos cientistas, apesar do curto período em que, mesmo já falecido, caiu em desgraça na Alemanha, na era nazista, por ter sido judeu.

O seu conceito de bala mágica é hoje fartamente utilizado, em muitos campos, inclusive na economia, apesar dos usuais efeitos colaterais produzidos pelas drogas quimioterápicas.

Na economia as balas mágicas, os pacotes, na guerra, as intervenções “cirúrgicas”, também produzem seus efeitos colaterais e reações adversas.

E a mágica, é cada vez menos mágica e mais realista, tendo a indústria de balas mágicas evoluído para a idéia de “coquetel”, desistido da cura definitiva. A doença torna-se crônica, mas não mortal. Eis que a AIDS acabou com a magia de Ehrlich e engordou os lucros dos fabricantes.