Sobre a performace e educação

Um momento de nossa última oficina A PALAVRA FALANTE me deixou curiosa. O que performace pode ter haver com educador e sua aula ou mesmo com a formação de leitores. Estou em busca e algumas coisas se insinuam. Lendo " Um corpo que oscila: performance, tradição e contemporaneidade na poética de Ricardo Aleixo" de Prisca Augustoni e ja tenho alguns insigths. Por enquanto posso pensar em uma desierarquização das tematicas escolares, ou talvez uma mudança de foco. Outro seria um empoderamento do corpo nos espaços, tema caro para mim. Sem dúvida a contribuição seria mais política que técnica.

Lendo Paul Zumthor achei esse trecho que achei proximidade entre performance poética e o fazer educativo que desejo para mim

" O ouvinte-espectador espera, exige que o que ele vê lhe ensine mais do que simplesmente o que ele vê, revele-lhe uma parte escondida desse homem, das palavras, do mundo. Essa voz não é mais a mera voz que pronuncia: ela configura o inacessível; e cada uma das suas inflexões, de suas variações de totalidade, de timbre, de altura... "

Ou

“Eis por que o verbo poético exige o calor de contato; e os dons da sociabilidade, a afetividade. Na performance poética, os movimentos do que se espalha, o talento de fazer rir ou se emocionar”

De repente eu ouço o Zumthor dizer aquilo que eu venho tentando explicar sobre a palavra sem corpo, pura, e sua escorregadia estrutura.

" Entendamos por poesia esta pulsão do ser na linguagem, que aspira a fazer brotar série de palavras que escapam misteriosamente, tanto ao desgaste do tempo, como à dispersão no espaço: parece que existe no fundo dessa pulsão uma nostalgia da voz viva"

Prefiro pensar que gosto daquilo que é familiar. E há algo de familiar nesse olhar sobre as cenas cotidianas à luz da compreensão acerca do que é performance. Nesse sentido, para mim, a performance é bem familiar.

Me lembro do desempenho de minha mãe nos enterros. É preciso dizer que minha mãe é apaixonada por enterros. Não uma paixão mórbida pela morte, mas uma paixão pelo ritual de chorar o morto. Minha mãe é uma excelente carpideira. E isso aqui em Belo Horizonte é coisa que vale um espetáculo. Somos, na maioria das vezes, contidos até na dor. Existe entre nós, digo nós a maior parte das pessoas que conheço, um certo contrangimento em expressar nossa dor de maneira mais intensa. É sempre uns óculos escuros, um travesseiro quente pra chorar, coisas do gênero. Posso até dizer que minha mãe é assim. Na maiorira das vezes.

Por que quando o assunto é enterro a coisa muda de figura. Ela chora publicamente e com maestria. Conta que certa vez chegou a ficar envergonhada diante de uma viúva desconhecida que perguntou de onde ela conhecia o morto. Não conhecia.

Sempre vi beleza no exercicio de carpir que minha mãe desempenhava nos enterros e agora posso dar categoria a ele. É uma perfomance familiar.

Assisti ontem, ao 41 anos , a primeira performace poética de minha vida. Primeira porque estou desconsiderando aqui todas as declamações escolares do passado não por desprezo mas por entender que o conceito é outro.

E só posso parodiar Zumthor: a poesia sente saudades da voz viva.

Durante a quase meia hora que vi e ouvi Renato Negrão , Ulisses Moisés, Victor Munhoz e Das Quebradas senti um misto de euforia, estranhamento e a mais legitima e profunda FELICIDADE. A multiplicidades de sensações deram um nó na minha racionalidade.

Ver a palavra poética alcançar tal extensão expressiva no espaço, ver como os objetos, as roupas, as imagem os sons mecânicos, a voz e a presença de palco de Renato me fizeram viver uma experiencia única. E olha que sou tão aficcionada com a poesia escrita que me sinto feliz só de ver versos no branco do papel. A performace foi para além disso.

Me surpreendi depois com a timidez de Renato durante as conversaçõs pós-performace. Ele havia flutuado em suas poesias sem nenhuma sombra de medo ou timidez. O poeta avança sobre o homem.

Não posso evitar um certo deslumbramento iniciante que talvez me faça parecer ingênua ou amadora. Não interessa. Valeu pelo que vivi.

Obrigada a todos que sei, trabalharam muito para obter aquele resultado.