O trabalho de Deus

“Porque desde a antiguidade não se ouviu, nem com ouvidos se percebeu, nem com os olhos se viu um Deus além de ti que trabalha para aquele que nele espera.” Is 64; 4

Um texto como esse mal compreendido daria pano pra manga, bem como dá, se devidamente interpretado. Grosso modo Deus trabalha pra mim e espero os benefícios graciosos de tal trabalho. Lembrei uma gaiatice de um amigo do litoral que disse: “Depois que li na Bíblia que ‘ aos seus amados, Deus dá o pão enquanto dormem’ não saio mais da cama”.

Diria que essas distorções de interpretação se dão em face a um choque de conveniências; essas, derivam necessariamente dos valores que abraçamos. Se alguém escolhe como modo de vida a fidelidade a Deus, ao tal, convém apenas a verdade, por soturna que se lhe apresente. A outrem que ainda não conhece a eficácia da cruz, mas, mesmo assim cobre-se com um verniz religioso, convêm as facilidades, a ilusão que há textos bíblicos que são o “tendão de Aquiles” Divino que nos permitiriam manipular o Santo.

Que Deus trabalha por nós é fato gritante. Basta que uma alma sóbria abra a janela para contemplar uma centelha do amor Divino pulsando nas obras que Ele fez. Se tal visão, ou, mesmo um tour pela Terra ampliando o escopo não for bastante para patentear o afeto do Eterno por nós, andemos um pouco no tempo voltando os olhos para o Calvário e a bruma se dissipará. Aceitar ao amor de Deus como coisa incondicional, qualquer um aceita; saber que há garantia de o sol ou a chuva darem-se a justos e injustos, enfim, essa generalidade da graça Suprema também é confortante a todos.

Entretanto, pautar nossas vidas de um modo que seja aprazível ao Pai, uma ousadia santa, ainda que ínfima de retribuir Seu amor demandaria aceitar como diretrizes Seus termos, e isso já não é tão pacífico assim.

Porém, precisamente isso é que se deve entender pela assertiva supra de “esperar em Deus”. Dado que Ele é Eterno, não se posiciona em relação ao tempo, como nós. Aliás, Cronos curva-se ao “Pai da Eternidade”. A nós foi proposta uma redoma de tempo e espaço dentro da qual devemos achar o caminho de volta à comunhão perdida, como ensina Paulo: “E de um só sangue fez toda a geração dos homens, para habitar sobre toda a face da terra, determinando os tempos já dantes ordenados, e os limites da sua habitação; para que buscassem ao Senhor, se porventura, tateando, o pudessem achar; ainda que não está longe de cada um de nós;” Atos 17; 26 e 27

Mas, mesmo nossa vida sendo um constante devir precisamos retroceder, às vezes, por causa de marcas que deixamos no tempo. Mais ou menos como o cursor de um programa de textos, que, avança sempre sobre espaços em branco, mas, eventualmente carece volver e mudar um caráter que saiu errado. Assim, nosso “corretor de textos”, a consciência, sublinha alguns atos que necessitamos rever; e a viagem no tempo retroativa é possível via arrependimento, confissão, para obtenção de perdão. Quanto mais usamos a prática, menos erros cometemos na escrita do livro da vida.

Nossas consciências, se não atingidas por vírus ( cautério ) trazem o programa de Deus, de modo que nos instam à correção de rumos segundo os Seus Padrões.

Daí, esperar em Deus não se equaciona com inércia, antes, com a manutenção de uma viva esperança, desde que, nosso nível de obediência possa qualificar nosso viver como sendo, “em Deus.”

Quando nossa “percepção” de Deus é meramente utilitária, nem de perto conhecemos Aquele que ensinou: “Mais bem aventurado é dar que receber.” Se minha leitura Bíblica é um garimpo de textos que me favorecem, e um descarte dos que me corrigem, como faz com os espinhos alguém comendo peixe, não passo de um hipócrita enganando a mim mesmo.

O tentador, aliás, fez uma apresentação seletiva de alguns textos ao Salvador, que revidou com um desafio à plenitude, não, parcelas da Palavra. “E Jesus lhe respondeu, dizendo: Está escrito que nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra de Deus.” Luc 4; 4

Dada a apostasia que grassa por toda parte, o mais pesado do trabalho Divino nesse tempo é iluminar aos simples para que saibam em quê consiste a razão da esperança. O trabalho de criar o Eterno consumou há muito e “viu que era muito bom”. O de regenerar está em pleno curso e aumentamos, quando, por preguiçosos recusamos conhecer Sua vontade, ou, por relapsos à obedecer. “…me deste trabalho com os teus pecados, e me cansaste com as tuas iniquidades.” Is 43; 24