ENSAIOS CINEMATOGRÁFICOS - ANTES DO AMANHECER

Esse é um daqueles filmes que falam sobre amor e sexo somente com a força das palavras e com a expressão dos olhares, pois desde o momento em que os personagens se conhecem, eles praticamente fazem amor o filme inteiro, consumindo o ato de fato somente ao fim do mesmo.

Aliás, o diálogo poderia ser considerado um dos personagens principais do filme, tamanha sua importância e relevância para a história. Fala-se praticamente sobre tudo no filme - amor, sexo, morte, reencarnação, filosofia, relacionamento, arte.

O filme inicia-se em um trem, onde um rapaz norte-americano conhece uma moça francesa e convida esta a ir para Viena, para ambos desfrutarem da companhia mútua e de seu último dia pela Europa. Ao amanhecer o rapaz voltaria aos EUA. Toda a história dos dois juntos desenrola-se, portanto, em um único dia, do entardecer ao amanhecer do dia seguinte.

Os dois visitam praticamente a cidade inteira, mostrando desde pontos turísticos clichês a lugares pitorescos e inusitados, combinando otimamente as locações usadas durante o filme. Não há grandes surpresas no filme, exceto o diálogo que permeia, juntamente com o silêncio o filme inteiro. Bela dicotomia. As poucas surpresas nos são mostradas de maneiras sutis e discretas. Em um momento do filme os dois entram em uma igreja e discutem sobre amor, relacionamento, casamento. Ele conta a ela em certo momento que o casamento quaker se dava em silêncio, ou seja, os noivos se olhavam sem dizer uma só palavra e após certo tempo em silêncio, quando ambos sentiam união pelo outro, o casamento estava consumado. Segue-se um pequeno silêncio entre os personagens, como se estes, estivessem consumando o ato naquele momento. A partir daí, e talvez até, o relacionamento deles desenrola-se como um verdadeiro casamento, conhecem-se,enamoram-se, casam na igreja, brigam, extasiam-se um pelo outro e se separam.

A trilha sonora do filme é belíssima e "casa" perfeitamente com o filme, desde peças de música clássica até o grunge que dominava a época - o filme se passa em 1994, se não me engano. Um dos melhores exemplos, do bom uso da trilha sonora, passa-se logo de início, quando ao chegar em Viena, os dois visitam uma velha loja de discos. Lá ela acha um disco antigo que resolvem escutar em uma pequena cabine. O modo como ficam em silêncio, escutando a música ao mesmo tempo que se olham e não querem se olhar, a música falando por eles tudo o que um sentia pelo outro é genial, sem clichês ou pieguices, tudo se desenvolvendo de uma maneira simples. A melodia do violão começando suave e aos poucos ficando melancólica, acompanhando a voz feminina que dá voz aos sentimentos e pensamentos dos dois "do norte sopra um vento, que disse que é amor o que sinto, venha aqui, venha aqui, não, não é possível de tocar, jamais te desejei tanto, venha aqui, venha aqui". Perfeito. Nunca dois personagens ficaram tão próximos e distantes ao mesmo tempo.

Já pelo fim do filme, os dois encontram cartazes nas ruas anunciando uma exposição de pinturas. A moça comenta ao rapaz que as pinturas demonstram que o ser humano é um ser transitório a paisagem em que ele se encontra, esta mais duradoura que as pessoas que estão nela. Porém o cineasta contradiz a si mesmo, quando mostra ao fim do filme, as mesmas paisagens e lugares que os dois visitaram ao longo da história, estas vazias, quase sem graça expostas a luz do sol, sem a poesia do luar e dos personagens, monstrando que as paisagens são transitórias sem a presença duradoura das pessoas.

scheidt
Enviado por scheidt em 19/05/2007
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