CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico III(8) “Fé e Vitalidade: Uma Análise Crítica da Visão Religiosa”

A relação entre religião, saúde e vitalidade é um tema controverso que envolve diferentes perspectivas e argumentos. Neste ensaio, pretendo analisar criticamente a visão religiosa que afirma que a saúde espiritual e física depende exclusivamente de escolhas específicas baseadas na fé e na obediência a Deus. Para isso, vou apresentar alguns contra-argumentos que mostram que a vitalidade da vida não pode ser reduzida à fé religiosa, mas envolve diversos fatores biológicos, socioeconômicos, culturais e éticos.

A visão religiosa que defende que a saúde e a vitalidade são frutos da fé e da obediência a Deus se baseia em provérbios bíblicos como: "O temor do Senhor é fonte de vida, para desviar dos laços da morte" (Provérbios 14:27) e "O meu filho, atenta para as minhas palavras; às minhas razões inclina o teu ouvido. Não as deixes apartar-se dos teus olhos; guarda-as no íntimo do teu coração. Porque são vida para os que as acham, e saúde para todo o seu corpo" (Provérbios 4:20-22). Esses versículos sugerem que a obediência aos mandamentos divinos é a única forma de garantir uma vida plena e saudável, tanto espiritual quanto física.

No entanto, essa visão desconsidera a influência de fatores biológicos e genéticos na saúde e vitalidade física de um indivíduo. A genética desempenha um papel fundamental na predisposição a doenças e na longevidade, independentemente da religião ou crença. Como afirmou o filósofo francês Voltaire: "A natureza sempre prevalece; nós somos totalmente determinados por ela" (Voltaire, 1756). Assim, não se pode negar que há uma variabilidade natural entre os seres humanos que afeta sua saúde e vitalidade de forma independente da sua fé.

Além disso, a visão religiosa sugere que a obediência a Deus é a única fonte de bênçãos e prosperidade. No entanto, a prosperidade e o bem-estar estão frequentemente ligados a fatores socioeconômicos, acesso a cuidados de saúde e educação, entre outros. Não se pode ignorar que muitas pessoas que não compartilham da mesma fé experimentam saúde e vitalidade em suas vidas. Como disse o filósofo grego Epicuro: "Não é nada mais do que opinião vazia que leva os homens à adoração dos deuses" (Epicuro, 300 a.C.). Assim, não se pode atribuir toda a prosperidade e felicidade à obediência religiosa, mas sim ao uso racional dos recursos disponíveis.

A visão religiosa também pressupõe que a obediência a Deus é a única maneira de evitar as consequências naturais do pecado. No entanto, essa afirmação desconsidera a diversidade de crenças e sistemas éticos que existem no mundo, cada um com suas próprias noções de moralidade e consequências do pecado. Como disse o filósofo dinamarquês Søren Kierkegaard: "O pecado não é algo objetivo; é uma relação entre o indivíduo e Deus" (Kierkegaard, 1849). Assim, não se pode impor uma única visão religiosa sobre o que é certo ou errado, mas sim respeitar as diferentes formas de compreender e viver a vida.

Em resumo, embora a fé e a obediência religiosa possam ser fontes de conforto e significado na vida de muitas pessoas, a saúde e a vitalidade são resultados de uma interação complexa de fatores, incluindo genética, fatores socioeconômicos, acesso a cuidados de saúde e educação, bem como crenças religiosas. Portanto, atribuir toda a vitalidade e bênçãos à obediência religiosa é uma visão simplista que não reflete a realidade da experiência humana. Como disse o filósofo alemão Friedrich Nietzsche: "Não há fatos, apenas interpretações" (Nietzsche, 1887). Assim, devemos estar abertos a questionar e dialogar com outras perspectivas, sem impor ou negar a nossa própria.