CRENTE SEM FANATISMO: DE CARNE E OSSO — Ensaio Teológico III(12) O castigo é prova de amor? — Heb, 12:6.

O amor de Deus é um tema central na fé cristã, que afirma que Deus é amor (1 João 4:8) e que demonstrou esse amor ao enviar seu Filho Jesus Cristo para morrer pelos pecados da humanidade (João 3:16). No entanto, muitas vezes se prega que o amor de Deus também envolve a adversidade e o castigo, como formas de disciplinar e corrigir os seus filhos (Hebreus 12:6). Neste ensaio, propomos uma análise crítica desse conceito, questionando a sua lógica e a sua ética, e sugerindo uma visão alternativa do amor de Deus.

Em primeiro lugar, é preciso reconhecer que a ideia de que o sofrimento é uma prova de amor é contraditória em si mesma. Como disse o filósofo Friedrich Nietzsche, "há sempre alguma loucura no amor. Mas há sempre um pouco de razão na loucura" (Nietzsche, 1882). Ora, se o amor é um sentimento que busca o bem do outro, como pode causar-lhe mal? Se o amor é uma virtude que implica cuidado, compreensão e empatia, como pode infligir dor? Em situações humanas, ninguém aceitaria que alguém lhe fizesse sofrer por amor, pois isso seria visto como abuso ou violência. Por que, então, aceitar essa lógica quando se trata de Deus?

Em segundo lugar, é possível argumentar que a ideia de que o castigo de Deus é uma forma de amor pode ser usada para justificar o sofrimento desnecessário. Como disse o teólogo Dietrich Bonhoeffer, "o sofrimento não é um problema a ser resolvido, mas um mistério a ser vivido" (Bonhoeffer, 1953). No entanto, muitas vezes se usa o sofrimento como uma forma de manipular ou controlar as pessoas, fazendo-as acreditar que estão sendo amadas por Deus quando na verdade estão sendo oprimidas ou exploradas. Isso levanta preocupações éticas sobre a legitimação da dor e do sofrimento como meios de demonstrar amor.

Em terceiro lugar, é possível sugerir que o amor de Deus pode ser expresso de maneiras mais positivas e compassivas. Como disse o apóstolo Paulo, "o amor é paciente, o amor é bondoso. Não inveja, não se vangloria, não se orgulha. Não maltrata, não procura seus interesses, não se ira facilmente, não guarda rancor. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. Tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta" (1 Coríntios 13:4-7). Em vez de usar o castigo como prova de amor, Deus pode demonstrar amor por meio de compaixão, orientação e apoio, ajudando os indivíduos a superar desafios de maneira menos dolorosa. Como disse o filósofo Voltaire, "o amor é uma tela fornecida pela natureza e bordada pela imaginação" (Voltaire, 1764).

Em conclusão, a ideia de que o sofrimento e o castigo são provas do amor de Deus pode ser questionável em termos de lógica e ética. É importante considerar alternativas que promovam a compreensão e a compaixão, em vez de justificar o sofrimento como uma demonstração de amor. Como disse o escritor Antoine de Saint-Exupéry, "o amor não consiste em olhar um para o outro, mas sim em olhar juntos na mesma direção" (Saint-Exupéry, 1943).