O conhecimento é mais que uma crença

A definição epistemológica de Platão que concebeu e definiu o conhecimento como “crença vendeira e justificada”, que se tornou definição tradicional epistemológica, e teve seu questionamento na contestação pelo grande filósofo norte-americano estadunidense Edmund Gettier (1927-2021), o qual colocou em xeque diante de um debate antigo filosófico a respeito.

O filósofo mostra que a definição de crença verdadeira e justificada não é o suficiente para definir o conhecimento em si, na sua devida qualificação do termo. E para isso, ele supôs como exemplo, um tal de Smith e Jones disputando um emprego. Enquanto Smith tem boas e até excelentes razões para crer que conseguirá o emprego porque e tem dez moedas no bolso.

A crença, no caso de Smith, deve-se ao fato ter ouvido falar que o presidente da empresa escolherá Jones para a vaga, e o fato de ele ter moedas no bolso, enquanto, também Jones que há dez minutos atrás, percebe uma evidência da asserção de que um homem tenha dez moedas no bolso, o que conclui que conseguirá também o emprego.

Após essa asserção afirmativa, supôs-se que Smith seja o escolhido para o emprego e que sabe que tem dez moedas no seu bolso. Novamente, o exemplar Smith acredita que conseguiu o emprego porque tem dez moedas no bolso. Pode-se dizer que tal assertiva é verdadeira, e por isso, Smith tem boas razões para crer que conseguiu o emprego por isso.

Num segundo exemplo, Smith acredita que Jones tem um carro Ford com boas razões, pois viu Jones andar com o carro Ford, várias vezes e até pegou carona com ele. Smith também conhece Brown, que é pouco conhecido por ele, o que lhe faz pensar, de modo aleatório, de que ou Jones tem um Ford e Brown está em Boston.

A verdade de tal proposição disjuntiva deriva de uma lógica da verdade de que Jones tem um Ford. Assim, Smith tem boas razões para crer na referida disjunção. Contudo, imagine que Jones não tenha um carro Ford, mas que pega emprestado o carro Ford do seu irmão, e Smith o observa dirigindo. E por acaso, Brown está em Boston naquela situação que observou.

Ora, essa proposição pode ser considerada verdadeira porque é caso de crença verdadeira e possui boas e melhores razões para crer e acreditar a respeito. Observa-se, então, que não é apropriado dizer que Smith sabe a verdade de Jones e Brown.

Gettier quis no seu ensaio de 1963 que não basta ter crença justificada e verdadeira para ser considerada conhecimento válido, pois conforme os exemplos apresentados, existe condições para explicar a justificação, para então ser considerado verdadeiro conhecimento.

Obviamente que não se pode conceber o conhecimento como crença verdadeira e justificada, de modo reducionista e limitado, uma vez que o conhecimento ultrapassa a crença em si, enquanto possibilidade de ser verdadeira ou não.

Crença vem da palavra crer, da confiança e se assemelha a fé, em muitos aspectos do senso comum da sociedade, o que a tipifica como algo que é possível ser verdadeira ou não. Se a crença for verdadeira, valida o conhecimento, mas sua definição em si ainda não define e nem conceitua, genuinamente, o que é o conhecimento.

Na concepção de Japiassu e Marcondes (2001), conhecimento é função ou ato da vida psíquica, que tem por efeito tornar um objeto presente aos sentidos e à inteligência. Também, definem como apropriação intelectual de determinado campo empírico ou ideal de fatos para assim utilizá-los e dominá-los. Portanto, conhecimento designa tanto a coisa conhecida, objeto a ser conhecido como o ato e o fato de conhecer pelo sujeito cognoscente.

Filosoficamente e epistemologicamente, o conhecimento ultrapassa a ideia de crença quanto a afirmação sobre o mundo (universo) ou ação no mundo (universo ou realidade), quando se verifica maior do que o valor da confiança do objeto conhecido, mas o que a mente concebe o que é verdadeiro ou não, certo ou errado, negado ou afirmado com a devida busca de identificação de série de princípios e diretrizes que auxiliam e diferenciam o que pode ser acreditado ou confiável, quando se concebe, mentalmente, uma certeza ou convicção advinda de verdadeira reflexão crítica do pensar.

Portanto, o conhecimento é algo a ser conhecido pelo cognoscente através da inferência das coisas a serem conhecidas “a priori”, quando se credibiliza as fontes, mas também quando assim acontece pela percepção e pelos sentidos.

O conhecimento, também, é algo a ser conhecido pelas abstrações lógicas do pensamento que proporciona descobertas de algo que ainda estava desconhecido, o que vai de encontro com a conceituação sobre a inteligência.

Há de se reconhecer que o conhecimento só é válido e verdadeiro, quando determinada informação creditada (decorrente da crença) por um processamento sistemático e com o devido crivo de critérios implícitos de significado deste algo conhecido e com a devida fundamentação lógica do pensamento e, conforme objeto a ser conhecido, passar pelo critério da percepção dos sentidos para se atribuir certeza e convicção do conhecimento.

REFERÊNCIAS

JAPIASSU, H. MARCONDES, D. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro:

Jorge Zahar, 2001.

UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO JOÃO DEL REI. NEAD. Curso de Licenciatura de Filosofia. Epistemologia I. Storyboard. Unidade IV. São João Del Rey: UFSJ, 2021.

Lúcio Rangel Ortiz
Enviado por Lúcio Rangel Ortiz em 18/01/2024
Reeditado em 18/01/2024
Código do texto: T7979548
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