Entrevistas
      Impossíveis (1)

(
Entrevista com o autor de romances policiais EO)
 
Conseguir esta entrevista foi difícil. Se existe glória em se conquistar algo difícil posso me sentir gloriosa. Primeiro, tive que arranjar um intérprete para traduzir minhas palavras do português para o inglês. Depois tive que enviar as perguntas para Kate Pinewood, a agente do meu entrevistado, para que ela as aprovasse. Então foram encaminhadas ao meu escritor predileto para que as respondesse. A entrevista foi um verdadeiro pingue pongue porque eu mandava uma pergunta e conforme vinha a resposta eu tinha que alterar o meu questionário enviando uma nova pergunta e esperando que fosse aprovada. E no final ainda recebi um documento para assinar dizendo que eu concordava com todas as exigências feitas pelo autor e sua agente, caso eu viesse tornar pública a entrevista:  se eu mudasse uma vírgula que alterasse o sentido ou alguma resposta ou pergunta fosse modificada eu seria processada. Não mudei nada. E mais, eu só poderia publicá-la em meu blog se omitisse o nome do escritor, designando-o apenas por suas iniciais. Antes de publicar tive ainda que devolver assinado o documento que estabelecia todas essas situações.    


Eu – Quando foi que você publicou o seu primeiro livro?

EO – Meu primeiro livro foi publicado há mais ou menos vinte anos atrás, quando eu já exercia a profissão de jornalista fazia treze anos.

EU – Por que deixou a profissão de jornalista e abraçou a de escritor de romances policiais.

EO – Eu era um jornalista investigativo e andei publicando coisas que desagradaram pessoas importantes. Tive que abandonar meu país e viver com documentos falsos em outro país. Por um acaso conheci a minha agente que resolveu publicar o meu primeiro livro.

EU – Então você não é você, é outro?

EO – Eu sou eu porque é impossível alguém ser outro que não ele próprio. Mas as pessoas não sabem quem eu sou e imaginam que sou outro.

EU – E qual é o seu país de origem?

EO – Só mesmo uma tonta para imaginar que eu diria qual é o meu país de origem. Se eu me esforcei tanto para esconder quem eu sou por que acha que eu iria lhe dar uma pista agora?

EU – Nem mesmo a sua língua de origem você pode dizer qual é?

EO – Na verdade quando eu nasci não falava língua nenhuma, mas depois adotei a de meus pais e eu decididamente não vou dizer qual era a língua deles porque eu não respondo a perguntas que envolvem meus familiares.
EU – Pelo menos pode me dizer se é casado?

EO – Sou divorciado e já vou antecipar a sua próxima
pergunta: não tenho filhos.

EU – Seus romances são ambientados em várias partes do mundo. Seu personagem principal é uma repórter investigativa que viaja pelo mundo e no caminho vai resolvendo crimes. Por que escolheu uma mulher para ser a protagonista de seus livros?

EO – Por várias razões: para que pensassem que eu realmente era mulher e não homem. Para que pensassem que eu escolhendo uma protagonista mulher queria que eles pensassem que eu era mulher, mas sendo um homem. Porque eu sempre quis ser mulher embora não seja. Porque fui criado em companhia de mulheres e conheço bem o Universo Feminino.

EU – Meio complicada essa resposta. Não sei se compreendi bem, nem se alguém vai compreender. Não importa: vamos passar para outra. Onde mora?

EO – Aqui e ali. Transito bem por toda Europa, mas tenho residência fixa. Onde? Que diferença faz? Eu não vou convidá-la mesmo para vir me visitar.

EU – Estou aqui pensando. Se você viaja tanto deve ter casas em várias partes do mundo. Pode-me falar pelo menos onde são essas casas?

EO – Eu disse que tenho residência fixa, eu não disse que tenho residências fixas. Você já ouviu falar em Hotéis? Cinco estrelas de preferência, que eu posso pagar.

EU – Agora eu peguei você. Se viaja tanto e fica em hotéis como ninguém nunca descobriu você, nenhum jornal noticiou que você estava hospedado aqui ou ali? Afinal você é uma personalidade.

EO – Você já ouviu falar em viajar incógnito, com outro nome?

EU – Quer dizer que você além de não ser você realmente ainda é outro?

EO – Outros. Ou outras.

EU – Bem, já vi que desse mato não sai cachorro. Então vamos mudar de assunto. Sobre o que será seu próximo livro?

EO – Bem, meu próximo livro não será realmente um romance policial nos moldes que eu tenho escrito. Estou já bem adiantado. Estou escrevendo a minha autobiografia. Mas meu plano é mais ambicioso ainda. Estou procurando um jovem repórter que conheci há muitos anos atrás e que de certa forma provocou mudanças em minha vida. Quando encontrá-lo vou propor-lhe que escreva a sua vida a partir desse mesmo acontecimento e aí, juntos, vamos intercalar as histórias e garanto para você, por esse livro ganharemos o Nobel de Literatura.

Eu_ Acho esse plano meio maluco. E se você não encontrá-lo?

EO – Se eu não encontrá-lo eu o reinventarei. Afinal esta é minha profissão. Inventar.

EU – Eu sei que você escreve Ficção. Então tudo o que você escreve é simplesmente inventado? Você inventa as histórias assim como você se inventou?

EO – Eu não invento histórias assim como não me inventei.
Eu apenas uso máscaras, mas tudo o que escrevo é verdade. E mais, eu estou cansado dessa troca de e-mails entre você e minha agente. É pergunta para cá e resposta para lá. Você já tomou muito meu tempo. (Preciso me dedicar a minha obra e aos meus estudos na Porta do Sol. Você está me desconcentrando

EU – Porta do Sol, o que é isso?
 
Bem, aqui a entrevista foi encerrada. Embora eu tivesse enviado outras perguntas não recebi respostas. O último e-mail que recebi foi de Kate Pinewood ordenando que eu parasse de importunar o tal escritor, mas é claro que não vou desistir. Para mim agora é questão de honra descobri-lo.
(Entrevista concedida a Maria Olímpia Alves de Melo, através de e-mails)