MASCULINIDADE E CUIDADOS DA SAÚDE

Dr. Márcio – Tenho problemas de saúde e freqüento alguns consultórios médicos. Apesar de saber que tenho este encargo, para me distrair busco observar situações ligadas à humanidade. Já perguntei a diversas pessoas com as quais convivo em Ambulatórios e sei que minha afirmativa é real: É muito raro vermos homens, principalmente os jovens, frequentando consultórios médicos. O senhor deve saber disto e eu pergunto porquê? Pode me responder? – Leonice.

Leonice – Sua pergunta parece um milagre de coincidência, pois a Revista “SER MÉDIco -66” editada pelo Conselho Regional de Medicina de São Paulo que chegou às minhas mão nesta semana, aborda exatamente este assunto, com o título acima, enfatizando que os homens se esquivam dizendo que “não tem tempo para gastar, buscando os serviços de saúde”.

Em cada três mortes que ocorrem na população adulta, duas acontecem entre os homens. Na faixa de 20 a 30 anos esta proporção passa para quatro homens para cada mulher e no estudo sobre as faixas do tempo médio de vida da população, percebe-se que os homens vivem sete anos menos que as mulhesres, levando a acreditar que os homens dão pouca importância com a saúde apropriada.

Como psiquiatra quero acrescentar que sei que as doenças vividas pelos homens, dão muito cansaço psíquico às famílias, ao contrário das mulheres, que aceitam mais calmamente seu estado, embora causem nos homens muito sofrimento com o estado delas. È como se estivessem perdendo parte do seu alicerce, quando os quadros se agravam, fazendo com que muitas doentes se preocupem menos com seus quadros, que com a psique masculina.

Entretanto, por mais inacreditável que possa parecer, existem mais homens envolvidos em serviços de saúde, em especial os de Atenção Primária à Saúde.

Coincidente com a Opinião da Revista, eu acredito que na busca menor da atenção à saúde, os homens agem assim para manutenção da idéia de masculinidade.

Em Psiquiatria então tenho cerca de dez mulheres para cada três homens e por incrível que possa parecer, os quadros vividos por eles são muito intensos, mesmo que não signifiquem gravidade física, mas psíquica..

O temor de estar se declarando “doente psíquico”, para não enfatizar o termo mental é claramente percebido.

Quando acompanham as esposas ao psiquiatra, quase sempre demonstra certa atitude de menos valorização ao estado delas, interpretado por mim, como pessoa insegura, ou fraca, mesmo quando se trata de quadros graves. Mas ao necessitarem tratamento agem com crianças assustadas, necessitando da “mãe”.

Um amigo a quem confidenciei o desejo de escrever uma explicação à sua pergunta, me inquiriu: Você não acha que isto pode agravar mais a situação nos consultórios?

Eu respondi que meu trabalho era explicativo e não julgador. Inquiri se ele achava preferível o uso de cigarros, drogas e álcool, ao contrário de buscar ajuda para fortificar-se , compreendendo os motivos que o levavam à fuga.

Deixo um exemplo claro: já viu algum anúncio de placa médica indicando o especialista em sexologia? Eu nunca vi. Nem aconselho nenhum médico colocar, pois o preconceito é muito grande. A pergunta que precisa ser respondida é: “Porque as pessoas sentem o preconceito?” A resposta sabida é: porque tem insegurança sobre o assunto tratado, tem medo de ser julgado com problemas, mesmo que vá buscar apenas uma orientação sobre um parente.

Creio em uma coisa séria: somos todos aprendizes e seremos covardes, se identificamos alguma defesa negativa, ao contrário de buscarmos entendê-la, mesmo que signifique buscar ajuda para nosso problema.

Para mostrar a certeza do que estou falando, conto um caso muito chocante: uma paciente retorna a uma de suas consultas acompanhada pelo esposo. Ao examiná-la, medicá-la e dar-lhe toda orientação sobre o prosseguimento do tratamento, ela, antes de despedir-se olha para o esposo e pergunta-lhe: “Falo eu, ou você?” Ele deu de ombros e ela falou: “Então fale você!” Ele retrucou: “O problema parece lhe afetar mais, fale você!”

Ela me contou que eles estavam sem vida sexual há mais de seis meses e ele se negava a procurar ajuda, embora se queixasse de dores próximas aos testículos e por isto não tinha ereção e se manipulado por ela, não chegava ao orgasmo.

Com paciência, embora suspeitando a causa, disse a ele que o quadro não era psicológico e sim orgânico podendo chegar a um desfecho grave.

Ele disse que embora sentisse aquele quadro, tinha quase razão para crer ser uma reação aos maus tratos que ela apresentava, quando os sintomas bem leves, foram comentados a ela.

Ao conseguirmos seu encaminhamento a um Urologista, os esxes realizados mostraram que ele tinha um câncer enorme na próstata, com formação de abscessos gigantes, que o levaram para os céus em 6 meses depois.

Segundo o artigo do CREMESP, os homens conversam mais com o pessoal das farmácias, ou nos pronto-socorros.

Leonice - Eu tenho uma pergunta a fazer: “Se a maioria das pessoas creem ter recebido a vida pela graça de Deus, para serem felizes, porquê tentam produzir um auto-flagelo, por mero preconceito de serem julgados fracos, pouco machos?

Meu abraço.

Marcio