Lei: de incentivo? Para a Cultura? Brasileira?

Marcio Dias é ator, pós-graduando em artes cênicas. Cursou a Casa de Artes de Laranjeiras, participou de oficina com Gerald Thomas, fez filmes, espetáculo de dança e peças. Atualmente possui um projeto teatral aprovado pela Lei de incentivo a Cultura, e vai dividir conosco sua experiência prática neste sentido.

Marcelo D'Amico – Primeiramente é um prazer entrevistá-lo. Conte-nos qual é o teu projeto e qual foi a inspiração para sua realização?

Marcio Dias – O prazer é todo meu. Meu projeto consta em levar para as escolas públicas do Estado do Rio de Janeiro 60 apresentações do espetáculo teatral “Hoje Avental, Amanha Luva” do autor Machado de Assis. Quando começamos a escrever o projeto, eu e um grande amigo, a primeira coisa que veio em nossas mentes foi: como é possível levar teatro a pessoas que não têm acesso e como fazer dessa profissão algo prazeroso e financeiramente viável? Foi aí que pensamos de cara nas Escolas Públicas do Estado, onde existem alunos que nunca foram ao teatro e que as apresentações poderiam ser feitas de forma prática e barata.

Marcelo D'Amico – Todo projeto envolve pelo menos três partes distintas, que são a criação, a aprovação pela Lei Rouanet e a captação de recursos. Em sua opinião, qual é a mais complicada e por quais motivos?

Marcio Dias – Todas essas etapas eu achei bastante complicadas e burocráticas. Mas a que tem um grau de dificuldade maior é a captação de recursos. Porque a criação é tua, vem de sua própria mente, a aprovação da Lei demanda de tempo e inteligência, agora, já a captação depende exclusivamente de dinheiro que o patrocinador esteja interessado em lhe dar. Aí sim, torna-se um problema gravíssimo.

Marcelo D'Amico – Qual valor foi aprovado pelo Ministério da Cultura para a realização de seu projeto? Houve algum ajuste nesse valor?

Marcio Dias – Foi aprovado R$ 196.872,04, mas eu havia pedido R$ 202.152,04. O valor do contador deles é mais barato que o meu, então tive que tirar a diferença e o restante foi de "repaginação" dos valores de impostos.

Marcelo D'Amico – A quantia aprovada para seu projeto está entre os de menor valor que conheço, (dentre muitos que conseguem recursos no Brasil); isso sem contar os poucos brasileiros que conseguem realizar vários projetos milionários por ano. Como você encara este cenário cultural brasileiro na prática?

Marcio Dias – Um problema nacional, que deveria ser amenizado pela própria Lei, que o torna corrompido. Porque o que acontece: você nunca terá problemas em pedir a Lei de incentivo a Cultura, pois não depende deles a entrada do dinheiro, depende sim, do Patrocinador que irá dar esta quantia ao Proponente do projeto. Ou seja, em vez da Lei nos proteger dos "abutres" do capitalismo, ela simplesmente nos joga em suas mãos. Sendo assim, as grandes corporações fazem as suas próprias leis, patrocinando somente os projetos que lhes darão um marketing imediato. E é exatamente isso que você vê nas ruas, projetos de grandes atores e diretores que não precisariam de patrocínio, pois sobreviveriam muito bem com a própria bilheteria. Um exemplo que podemos citar é o Bradesco patrocinando o Cirque du Soleil. Pergunto-me, precisava mesmo?

Marcelo D'Amico – Poderia nos dizer quantos Produtores Culturais, dentro das empresas buscadas por ti, analisaram seu projeto, ou esta análise fica restrita a publicitários no setor de Marketing?

Marcio Dias – Não tenho como saber quantos analisaram o meu projeto e quem fez isso. Só sei que, toda vez que eu ligava para uma empresa eu tinha que falar especificamente com o setor de marketing.

Marcelo D'Amico – Muitos culpam a Lei de Incentivo, outros culpam o Ministério da Cultura e há quem fale das empresas. Afinal, onde está o problema? Como podemos melhorar esta realidade?

Marcio Dias – O problema está no brasileiro. Não haverá melhoras porque, nós brasileiros, gostamos do que acontece. Primeiro aceitamos as falhas e aberturas que existem nas Leis. Segundo, deixamos que o Ministério da Cultura não fiscalize as empresas. Terceiro, as empresas são detentoras de uma grande quantia de dinheiro, que compra o Ministério e conseqüentemente suas Leis. Cheguei a pensar em parar de comprar os produtos que não me patrocinavam, cheguei a triste conclusão que poderia passar fome, literalmente (risos).

Marcelo D'Amico – Para finalizar, deixe uma dica para todos que desejam beneficiar-se da Lei de Incentivo.

Marcio Dias – Não desistam nunca. Se todos tentarmos ao mesmo tempo, como um pedido de socorro ao Governo Federal, quem sabe um dia ele resolve dar uma de Robbin Hood.