A parede

Ele juntou suas chaves, carteira e o telefone celular. Colocou tudo no bolso da bermuda, abriu o portão e saiu com o carro.

Sequer havia amanhecido, então deu de cara com ruas praticamente vazias.

Ligou o rádio e ouviu as primeiras notícias do dia.

Morte, crise, corrupção e mais um pouco de morte, seguido pelos resultados do futebol. Tudo vomitado numa coisa só pelo locutor do rádio. Não espantava que as pessoas já haviam naturalizado toda aquela loucura.

Ruas e esquinas foram se sucedendo, e num sinal de trânsito, deu de cara com uma prostituta no fim de seu turno.

Ela se aproximou do carro antes que ele tivesse tempo de subir o vidro e falou

- Oi meu bem, por que essa cara? Por 100 conto eu te boto um sorriso no rosto.

- Não, obrigado. Ele respondeu, e arrancou com o carro antes mesmo do sinal abrir.

Torceu que um caminhão o acertasse e abreviasse a agonia. Mas o caminho estava livre.

Seguiu, pensando na parede.

Aquela parede, com as fotos penduradas. Retratos de outros tempos. De tempos mais simples.

Lembrou dos nomes que riscava. Lembrou do nome dela.

Na sua frente, só via a parede.

O telefone tocou. Uma, duas, três vezes.

Jogou-o pela janela para que se calasse. E calou também o rádio.

Passou a marcha. Acelerou e olhou em frente.

Lá estava a parede. Do quarto. Onde ele havia riscado o sorriso dela.

Acelerou. O carro pediu marcha... ele deu.

e esperou que a parede chegasse, e trouxesse o silêncio consigo.

o mesmo silêncio que restou

quando ela foi embora.

Rômulo Maciel de Moraes Filho
Enviado por Rômulo Maciel de Moraes Filho em 08/03/2018
Código do texto: T6274272
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