O Príncipe Sapo

Ele se odiava. Odiava sua aparência, odiava seu jeito, odiava existir... Mas estava cansado de se odiar. E por estar cansado queria desistir de tudo, principalmente da vida.

Por se odiar tanto achou que os outros também o odiavam e começou a se isolar.Deixou seu reino nas mãos dos outros e foi pro alto da torre. Levou apenas seu espelho e mais nada, deixou tudo pra trás e se trancou na torre. E ficou lá, sozinho, quietinho, isolado, remoendo seus pensamentos.

Seus pensamentos eram um tormento. Pareciam mil vozes falando ao mesmo tempo : " Você é feio." " Você é velho." " Você é chato". "Ninguém gosta de você." " Ninguém te quer." " Vai morrer sozinho."...

E cada um desses pensamentos era como uma facada em sua alma, doíam. E como doíam. Mas ele não lutava mais contra eles, deixavam o sufocar, o estrangular... E ele morria aos poucos.

Não queria mais sair, não queria mais ver os outros, mal se alimentava, não se divertia... E vivia assim, só às vezes chegava na janela da torre e ficava observando os outros lá embaixo.

" Os príncipes lá embaixo são lindos. São belos. São ricos. São poderosos... Eles tem todas as princesas, tem todos os amores, tem tudo... Tudo... E eu não. Eu não tenho nada e nem ninguém" E assim ele pensava, e brigava com Deus por tê-lo feito assim feio, chato...

Ele queria ser como os príncipes lá fora. Eles sorriam, se divertiam, eles eram felizes... Mas o que era felicidade? Ele não sabia mais. O tempo passava, e ele cada vez mais velho, como aproveitar a vida? Como ter essa felicidade?

Os outros tinham e ele não podia mais ter... E com certa inveja, ele saia da janela e ia se olhar no espelho. E ele se via horrível, feio, asqueroso...

A pele seca, com algumas rugas, alguns fios brancos teimando em aparecer... Ele estava descuidado, mal arrumado, com a roupa sem passar, até mesmo com alguns furos. Os dentes amarelos, e a barba mal feita. Cabelo desgrenhado, e estava cada vez mais gordo... Ele já não era mais um homem, parecia um monstro, uma besta, um... Sapo.

Sim, ele se achava um sapo. Um desses asquerosos que as pessoas tem nojo. Ele começou a chorar e quando viu seu reflexo chorando, viu que ficou mais feio ainda e num acesso de raiva deu um murro no espelho.

Mas o espelho não se quebrou, apenas onde sua mão batera tinha saído o pó... E ele se olhou. Onde não havia mais pó era diferente do resto do espelho... Ele piscou várias vezes, mas na parte limpa ele estava bonito.

Então o príncipe desesperadamente começou a limpar o espelho com a ponta de seu manto e foi vendo aquela transformação. E ele não era mais um sapo, era príncipe de outrora.

Agora ele chorava de felicidade. E as lágrimas pareciam limpar seus olhos e como se fosse algo impossível ele se tornava mais belo.

- Até que enfim. - Disse uma voz saída do nada.

O príncipe assustado olhou para todos os cantos e nada viu e perguntou.

- Quem está ai?

- Sou eu, o espelho!

O príncipe esfregou os olhos e viu um rosto lindo se formar no espelho.

- Você aprendeu a lição caro príncipe. Você nunca foi sapo, foi apenas um momento de fraqueza que você juntou com suas mágoas e tristezas e isso turvou sua visão. Toda essa angústia te transformou no sapo que você via... Mas só você se via assim.

- Como é que é?

- Sim alteza, os outros te viam como sempre você foi, belo, simpático, amigo... Mas sua dor era maior que tudo e você deixou que ela quase te cegasse. Era muita dor na alma, isso sujou sua visão interna e me sujou também. Então por isso que você se via o mostro... Mas nunca existiu mostro... Agora príncipe, aprenda. Não deixe que as pequenas dores se acumulem, elas turvam a sua estima.

E o príncipe chorando de felicidade concordava com a cabeça e via que o espelho tinha toda razão.

- É verdade cara espelho, acumulei muita dores, muitos sofrimentos e isso me fez desistir de tantas coisas e eu cansado não quis mais lutar. Mas agora vejo que eu posso ainda fazer muito mais... Ser muito mais e principalmente ser feliz.

- E você será alteza! Você será...

O príncipe sorriu se olhando no espelho, viu agora sua essência que estava escondida e correu de volta para a vida.