O FIM DA FARRA DE FELISBERTO.

-"Cheddar. Passe a frente quem tiver cheddar." O morcego voou e passou a frente da fila de bichos. O pedaço de queijo caiu na banca de Felisberto, o rato. Ele sorriu, satisfeito. -"Dez acerolas, é justo." O morcego Morgado pegou a sacolinha de frutas e voou pra longe. O esquilo Ésquilo trocou mel por duas nozes. A banca do roedor bombava nos bueiros fétidos abaixo da esquina da rua do sapateiro. -"Pessoal, tenho que pegar meus sobrinhos na escola. Renata vai atender vocês." A ratinha sorriu. Estava feliz com seu emprego na banca de Felisberto. Mais tarde, em casa, o rato repartiu o pedaço de queijo cheddar pra família de doze roedores. -"Você deveria trazer mais comida, Bertinho. Sua banca é popular mas deveria crescer." Disse a ratazana mãe. Rômulo, o rato jovem, concordou. -"A bicharada tem que ser explorada, pagar bem mais. O senhor pode crescer, ser o rei da rua." Rildo, o rato metido a Einstein, ergueu o dedo. -"Calculei bem, meu caro. Você traz dois grãos de arroz da fazenda e troca com frutas com Pierre, o pássaro. As frutas são trocadas por outras coisas que a bicharada adora. Se você trouxesse mais arroz, receberia mais frutas e mais mercadorias." Felisberto sentiu os olhares sobre eles. Ele engoliu em seco. -"A família está crescendo." Disse Roberta, sua prima rata que estava grávida. Felisberto foi dormir com a dúvida na cabeça. Ele adormeceu e sonhou com uma vida de luxo e opulência. Era o rei da rua. Ele trazia dez grãos de arroz ao pássaro Pierre. Outros pássaros chegaram e o rato não conseguiu levar tanta fruta pra banca. A fila de bichos com mercadorias pra troca era enorme. Ele sonhou com o início de sua aventura. Há três meses, fugindo de uma cobra faminta, Felisberto correu muito. Estava entregue, sem forças e acuado. A cobra ganhava terreno e abriu a boca pra comer o roedor. Felisberto viu uma abertura no cano de esgoto da cidade. Era sua única saída. Ele pulou mas a cobra foi atrás. O jato de esgoto o impulsionou e o jogou pra fora. -"Estou fora da cidade. Estou no campo." Felisberto sentiu a presença da cobra. Ele juntou forças e correu até um celeiro. Escondido. Aterrorizado. Uma sombra. A cobra se aproximando. Debaixo do celeiro, Felisberto era presa fácil. Algo caiu na sua cabeça. O rato viu o grão de arroz na sua frente. -"Que coisa. Caiu um grão de arroz." Ele olhou para cima e viu que um prego furava um saco de arroz. A cobra se aproximava quando um pássaro a pegou pelas garras. Felisberto vibrou. Ele saiu do celeiro. -"Obrigado, amigo. Essa víbora queria me comer." O pássaro esmagou a cabeça da cobra. Agradecido, o rato jogou o grão de arroz para o pássaro. -"Oh, um grão de arroz. Obrigado, meu amigo. Me chamo Pierre. Vou trazer frutas pra você. Gosta de frutas?" Felisberto foi sincero. -"Não é minha praia, adoro queijo. Posso trocar as frutas por queijo e outras coisas." E assim nasceu a amizade entre o rato Felisberto e o pássaro Pierre. Livre da cobra, Felisberto passou um dia inteiro debaixo do celeiro. Ele viu que caíam dois grãos de arroz por dia, às onze e e quinze horas. Ele passou a recolher os grãos. Montar a banca de trocas foi questão de tempo. O dia amanheceu. Felisberto pegou um prego grande e se dirigiu ao celeiro. Ele jogou um fio e subiu por ele até o saco de arroz que o prego furava. Suando muito, ergueu o prego grande e cutucou o saco de arroz. Mais de vinte grãos de arroz caíram sobre ele. Felisberto caiu, feliz. Ele nadou sobre o arroz. -"Consegui, vou mudar de patamar." Horas depois, Pierre voou e trouxe mais pássaros. Cada um deles pegou um punhado de arroz. A família de Felisberto veio ajudar a carregar as frutas. A fila de bichos dobrava a esquina. Felisberto estava feliz. A toca cheia de comida. O roedor era carregado pelos bichos. -"Uau. O sonho se tornou real" Duas semanas, a rataiada estava gorda, de tanto comer. Felisberto estava gordo e exalando felicidade. O rato Renê, contratado pra buscar o arroz, deu a dolorosa notícia. -"Não tem mais arroz. Não caiu nada no celeiro." Felisberto sentiu as pernas fraquejarem. Amparado pelos familiares, o roedor se recuperou. Decidiu ir até o celeiro. O buraco estava tapado com madeira. Não dava pra ver o saco de arroz. Felisberto chorou. Conversou com o galo e descobriu que o fazendeiro percebera que o saco de arroz diminuiu bastante. -"Tinha um furo grande no saco de arroz. Até um prego antigo o fazendeiro retirou." Informou o galo bem informado. Desolado, Felisberto saiu do celeiro. Cabisbaixo, pensativo, triste. Nem viu a cobra se aproximando. Um bote e já era. Foi o fim da farra de Felisberto, o rato ganancioso. F im

marcos dias macedo
Enviado por marcos dias macedo em 01/03/2022
Reeditado em 01/03/2022
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