Corrupção no Período Regencial

Em meio a tantas acusações de corrupção em várias esferas da "res publicae", e a tantas operações da Polícia Federal pipocando em vários pontos do continente brasileiro, apareceram, no setor de Análise Sintática, suspeitas de desvio de Preposições, o que afetava em demasia o aproveitamento sintático dos Objetos Indiretos.

Era de conhecimento público que um indivíduo conhecido apenas como Intransitivo mediava o grandioso esquema, e que um tal Sujeito operava pessoalmente as ações de desvio.

Mas o Sujeito, como que elipticamente, ocultara-se, desaparecera; porém, encontrar os Transitivos envolvidos parecia tarefa fácil. Gostar, Precisar, Necessitar estão na lista dos indiciados já capturados. Sabe-se que em determinados tempos desviaram, e ainda desviam, as Preposições sem alguma cerimônia; não se sabe ainda para onde remeteram os produtos subtraídos. Outro indiciado, Assistir, nega, apesar das evidências, ser ativo no esquema; mas confessa que colaborou, diretamente, para que Sujeito atuasse passivamente em algumas regências.

Felizmente, já se descobriu a compra indiscriminada, pelo setor de Regência Verbal – no qual o mesmo Sujeito tinha cargo importante – , de outros tipos de Preposições. Neste caso, alguns suspeitos já foram identificados. Réus confessos, Namorar e Pisar estão entre os maiores corruptos daquele setor: as Preposições do tipo Com e Em são usadas despudora e transitivamente com o apoio de diversas classes da sociedade. E não é só. Incorporar, Coincidir e Conformar-se foram absolvidos da mesma transgressão há algum tempo; receberam lotes e mais lotes de Em e Com, o que ocasionou a demissão em massa de Objetos Diretos. Objetos Indiretos conseguiram apoio de quatro dos seis Pronomes Pessoais Retos – Tu e Vós não votaram – do Supremo que absolveram aqueles e alguns outros que ficaram conhecidos entre os burocratas gramaticais como Pleonásticos. Namorar e Pisar esperam o mesmo tratamento e pedem o estudo da jurisprudência do caso aos seus advogados.

Conjetura-se que o Aposto e alguns Adjuntos, principalmente os Adnominais, são coniventes no caso do desaparecimento do Sujeito. A imprensa trata o caso do Sujeito com forte apelo sensacionalista, mas já é sabido que alguns do meio estão sendo beneficiados pelo esquema. Mas uma declaração do Indeterminado, sujeito sobre o qual não recaem suspeitas, à repórter de um folhetim gramatical que o indagara sobre o sumiço do Sujeito, fez com que todos os presentes se escandalizassem com o tom debochado da resposta:

- O Sujeito, minha querida, sem sombra de dúvidas, não está no Predicado!!!

A operação continua, mas, mesmo que capturado o Sujeito, certamente algum Nome ou Pronome influente, que podem chegar a exercer a função do suspeito, e que, indubitavelmente, também quererá seu quinhão, livrá-lo-á de qualquer condenação.

Descansemos, porém, porque “qualquer” desvio de um Sujeito lingüístico que se ache perfeitamente aceitável, breve pode virar norma na Língua, e em meio a todo esse escândalo, ocorre paralelamente outra forma de corrompê-la, como as terríveis linguagens "msn", estas sim, imperdoáveis quando transpõem a fronteira virtual. Esperamos que ninguém influente apoie mais este descalabro.

Rogerio Bandeira
Enviado por Rogerio Bandeira em 25/05/2009
Reeditado em 06/03/2020
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