ESTUDANDO REGÊNCIA VERBAL

Prólogo

Mais uma vez, por entender que a dúvida de um estudante, pesquisador, autodidata, consulente etc. é, também, a dúvida de muitos outros interessados no aprendizado da língua pátria, resolvi publicar mais um texto para o deleite dos meus inúmeros leitores e candidatos aos concursos. Não é demais lembrar que na internet e nas boas gramáticas da língua portuguesa encontraremos tudo o que é relacionado a regência verbal.

Há quem defenda ser necessário decorar tais ou quais matérias. Discordo veementemente. Compreender as bases de quaisquer assuntos e resolver exercícios é fundamental para um sólido e permanente aprendizado. Preliminarmente informo que, para uma completa e satisfatória aprendizagem do assunto em comento (regência verbal) é fundamental o estudo e a resolução de inúmeros exercícios sobre PREDICAÇÃO VERBAL.

ESTUDANDO PREDICAÇÃO

Para o estudo do predicado, é necessário verificar se seu núcleo significativo está num nome ou num verbo. Além disso, devemos considerar se as palavras que formam o predicado referem-se apenas ao verbo ou também ao sujeito da oração. Vejam o exemplo abaixo:

As crianças necessitam de cuidados especiais

Sujeito = As crianças

Predicado = Necessitam de cuidados especiais

O predicado, apesar de ser formado por muitas palavras, apresenta apenas uma que se refere ao sujeito: “necessitam”. As demais palavras ligam-se direta ou indiretamente ao verbo (necessitar é, no caso, de algo), que assume, assim, o papel de núcleo significativo do predicado.

Já no exemplo: A mulher é bela. Temos como sujeito: “A mulher” e o predicado: “é bela”. Observamos que no exemplo acima, o nome “bela” se refere, por intermédio do verbo, ao sujeito da oração. O verbo agora atua como elemento de ligação entre sujeito e a palavra a ele relacionada. O núcleo do predicado é “bela”.

Tomando por base o núcleo do que está sendo declarado, podemos reconhecer três tipos de predicados: verbal, nominal e verbo-nominal. No texto ora apresentado vou me ater apenas ao Predicado Verbal que apresenta as seguintes características:

a) Tem um verbo como núcleo;

b) Não possui predicativo do sujeito;

c) Indica ação.

SINTAXE DE REGÊNCIA

A sintaxe de regência é a relação sintática de dependência que se estabelece entre o verbo — termo regente — e o seu complemento — termo regido — com a presença, e não irá mais usar ou não de preposição.

Em outras palavras: Dá-se o nome de regência à relação de subordinação que ocorre entre um verbo (ou um nome) e seus complementos. Ocupa-se em estabelecer relações entre as palavras, criando frases não ambíguas, que expressem efetivamente o sentido desejado, que sejam corretas e claras.

COMPLIQUEI? VOU EXPLICAR MELHOR

Pra explicar a regência verbal ocorre que eu não poderia deixar de tecer algum comentário sobre a REGÊNCIA NOMINAL. Os termos, quando exigem a presença de outro chamam-se regentes ou subordinantes; os que completam a significação dos anteriores chamam-se regidos ou subordinados.

Quando o termo regente é um nome (substantivo, adjetivo ou advérbio), ocorre a regência nominal. Quando o termo regente é um verbo, ocorre a regência verbal. Isto mesmo. Estou sendo claro e direto sobre um assunto que alguns estudantes, menos dedicados e mais recalcitrantes, consideram complexo em demasia.

Exemplo: Vianna tem necessidade de ajuda – Aqui temos uma regência nominal. O termo regente é um nome (necessidade). O termo regido: (de ajuda).

Outro exemplo: Vianna necessita de ajuda – Neste exemplo existe uma regência verbal. O termo regente é um verbo (necessita). O termo regido é um objeto indireto (de ajuda).

Na regência verbal, o termo regido pode ser ou não preposicionado. Na regência nominal, ele é obrigatoriamente preposicionado. Prestem a devida atenção! Escrevi:

“Na regência nominal, ele é obrigatoriamente preposicionado”.

FICOU MAIS FÁCIL? VOU FACILITAR MAIS AINDA COM EXEMPLOS

O estudo da regência verbal permite-nos ampliar nossa capacidade expressiva, pois oferece oportunidade de conhecermos as diversas significações que um verbo pode assumir com a simples mudança ou retirada de uma preposição. Observem:

1. A mãe agrada o filho. – agradar significa acariciar.

2. A mãe agrada ao filho. – agradar significa "causar agrado ou prazer", satisfazer.

Logo, conclui-se que "agradar alguém" é diferente de "agradar a alguém".

O conhecimento do uso adequado das preposições é um dos aspectos fundamentais do estudo da regência verbal (e também nominal). As preposições são capazes de modificar completamente o sentido do que se está sendo dito. Vejam os exemplos:

1. Cheguei ao metrô.

2. Cheguei no metrô.

No primeiro caso, o metrô é o lugar a que vou; no segundo caso, é o meio de transporte por mim utilizado.

CONCLUSÃO

O estudo da regência verbal nos ajuda a escrever melhor. Quem usa o idioma pátrio como ferramenta de trabalho sabe o valor do que estou asseverando. Não é de bom grado um professor, jornalista, advogado ou outro profissional de nível superior escrever ou falar:

“Ele já tinha avisado a sua filha os perigos de uma gravidez inesperada durante os festejos momescos”.

Observamos que “já tinha” deveria ser substituído por “já havia”. É claro que o povão usa de forma trivial o verbo "ter" no sentido de "haver ou existir", mas isso constitui uma aberração formal no idioma português, embora seja compreendido pela força da linguagem coloquial, descontraída, informal.

Um detalhe interessante é que até os mais esclarecidos radialistas que fazem o JN da Globo, assim como nos noticiosos das demais TV, quase todas as noites, dizem: “Já tinha...” quando deveriam verbalizar: “Já havia ou existia...”. A abominável expressão "Já tinha" assemelha-se a outras não menos detestáveis: "A nível nacional, estadual, municipal...".

É importante saber que as expressões "a nível de" e "em nível de" não estão erradas, mas são refutadas pelos gramáticos, ou seja, pela norma culta da língua. Há sim um exagero e o uso equivocado de tais locuções que já tomaram o lugar de outras como: "com relação", no âmbito", "em relação a", "no que concerne", "quanto a", dentre outras. Esse fato não é bom, pois delimita a língua portuguesa, a qual é vasta, versátil e rica em vocabulário!

Todavia, sabemos que na linguagem coloquial tudo pode! Ah! Tudo pode com uma grandiosa ressalva: Só a depender do nível cultural do grupo que interage por meio da palavra. É feio e não pega nada bem falar ou escrever errado, mormente quando se trata de profissionais da comunicação.

No Facebook há quem escreva felicidade com "s"! Pode? Claro que pode, mas não deveria. Por ocasião de uma prova discursiva o candidato que escreve: "Se sentindo ansioso, triste, alegre etc." lamentará a perda da vaga para quem se esmerou na grafia, colocação pronominal e regência verbal.

EXEMPLOS DE REGÊNCIA

ASPIRAR

O verbo aspirar pode ser transitivo direto ou transitivo indireto.

Transitivo direto: quando significa “sorver”, “tragar”, “inspirar” e exige complemento sem preposição.

— Analu aspirou o aroma das flores.

— Todos nós gostamos de aspirar o ar do campo.

Transforma-se em transitivo indireto: quando significa “pretender”, “desejar”, “almejar” e exige complemento com a preposição “a”.

— O candidato Henrique aspirava a uma posição de destaque.

— Vianna sempre aspirou a esse emprego.

OBSERVAÇÃO OPORTUNA E PERTINENTE

O verbo aspirar quando é transitivo indireto não admite a substituição pelos pronomes lhe(s). Devemos substituir por “a ele(s)”, “a ela(s)”.

— Aspiras a este cargo?

— Sim, aspiro a ele. (e não “aspiro-lhe”).

ASSISTIR

O verbo assistir pode ser transitivo indireto, transitivo direto e intransitivo. Transitivo indireto: quando significa “ver”, “presenciar”, “caber”, “pertencer” e exige complemento com a preposição “a”.

— Assisti a um filme. (ver).

— Tiririca assistiu ao jogo.

— Este direito assiste aos estudantes. (caber).

Transitivo direto: quando significa “socorrer”, “ajudar” e exige complemento sem preposição.

— O médico assiste o ferido. (cuida).

Obs.: Nesse caso o verbo “assistir” pode ser usado com a preposição “a”.

— Assistir ao paciente.

Intransitivo: quando significa “morar” exige a preposição “em”.

— O papa assiste no Vaticano. (no: em + o).

— Eu assisto no Rio de Janeiro ou Eu assisto em Campina Grande.

“No Vaticano”, “no Rio de Janeiro” e “Em Campina Grande” são adjuntos adverbiais de lugar.

CHAMAR

O verbo chamar pode ser transitivo direto ou transitivo indireto.

É transitivo direto quando significa “convocar”, “fazer vir” e exige complemento sem preposição.

— O professor chamou o aluno.

É transitivo indireto quando significa “invocar” e é usado com a preposição “por”.

— Analu chamava por Jesus.

Com o sentido de “apelidar” pode exigir ou não a preposição, ou seja, pode ser transitivo direto ou transitivo indireto. Admite as seguintes construções:

— Chamei Wilson de bobo. (chamei-o de bobo).

— Chamei a Henrique de bobo. (chamei-lhe de bobo).

— Chamei Wilson bobo. (chamei-o bobo).

— Chamei a Henrique bobo. (chamei-lhe bobo).

VISAR

Pode ser transitivo direto (sem preposição) ou transitivo indireto (com preposição). Quando significa “dar visto” e “mirar” é transitivo direto.

— O funcionário já visou todos os cheques. (dar visto).

— O arqueiro visou o alvo e atirou. (mirar).

Quando significa “desejar”, “almejar”, “pretender”, “ter em vista” é transitivo indireto e exige a preposição “a”.

— Muitos visavam ao cargo.

— Ele visa ao poder.

Nesse caso não admite o pronome lhe(s) e deverá ser substituído por a ele(s), a ela(s). Ou seja, não se diz: viso-lhe.

Obs.: Quando o verbo “visar” é seguido por um infinitivo, a preposição é geralmente omitida.

— Ele visava atingir o posto de comando.

ESQUECER – LEMBRAR

— Lembrar algo – esquecer algo.

— Lembrar-se de algo – esquecer-se de algo (pronominal).

No 1º caso, os verbos são transitivos diretos, ou seja exigem complemento sem preposição.

— Vianna esqueceu o livro.

No 2º caso, os verbos são pronominais (-se, -me etc.) e exigem complemento com a preposição “de”. São, portanto, transitivos indiretos.

— Ele se esqueceu do caderno.

— Eu me esqueci da chave.

— Eles se esqueceram da prova.

— Nós nos lembramos de tudo o que aconteceu.

Há uma construção em que a coisa esquecida ou lembrada passa a funcionar como sujeito e o verbo sofre leve alteração de sentido. É uma construção muito rara na língua contemporânea, porém, é fácil encontrá-la em textos clássicos tanto brasileiros como portugueses. Machado de Assis, por exemplo, fez uso dessa construção várias vezes.

— Esqueceu-me a tragédia. (cair no esquecimento).

— Lembrou-me a festa. (vir à lembrança).

O verbo lembrar também pode ser transitivo direto e indireto (lembrar alguma coisa a alguém ou alguém de alguma coisa).

PREFERIR

É transitivo direto e indireto, ou seja, possui um objeto direto (complemento sem preposição) e um objeto indireto (complemento com preposição).

— Prefiro cinema a teatro.

— Prefiro passear a ver TV.

Não é correto dizer: “Prefiro cinema do que teatro”.

SIMPATIZAR

Ambos são transitivos indiretos e exigem a preposição “com”.

—Não simpatizei com os jurados.

QUERER

Pode ser transitivo direto (no sentido de “desejar”) ou transitivo indireto ( no sentido de “ter afeto”, “estimar”).

— A criança quer sorvete.

— Quero a meus pais.

NAMORAR

É transitivo direto, ou seja, não admite preposição.

— Maria namora Henrique.

Obs.: Não é correto dizer: “Maria namora com Henrique”. É claro que as amigas da Maria falam isso a todo instante para todos... Até para a torcida do Flamengo!

OBEDECER

É transitivo indireto, ou seja, exige complemento com a preposição “a” (obedecer a).

— Devemos obedecer aos pais e superiores hierárquicos.

Obs.: embora seja transitivo indireto, esse verbo pode ser usado na voz passiva.

— A fila não foi obedecida.

VER

É transitivo direto, ou seja, não exige preposição.

— Eduardo viu o filme.

Repito para não deixar dúvidas: O segredo de um profícuo aprendizado, seja de qual matéria for, está na pratica incansável e recalcitrante de inúmeros exercícios.

Enfim, se alguns poucos leitores ou mesmo apenas o notável consulente (Artur Vianna) considerar satisfatória esta minha explicação sobre REGÊNCIA VERBAL... Considerar-me-ei satisfeito, com a certeza do dever cumprido, e saberei que valeu a pena este meu modesto trabalho.

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NOTAS REFERENCIADAS

— Novíssima Gramática da Língua Portuguesa - Domingos Paschoal Cegalla;

— Vocabulário Ortográfico do Português;

— Moderna Gramática Portuguesa - Evanildo Bechara;

— Assuntos Relacionados da Academia Brasileira de Letras;

— Gramática da Língua Portuguesa - Pasquale Cipro Neto;

— Blog InfoEscola — Texto de Cristiana Gomes;

— Textos do Autor (Dúvidas de Português – Fases: 1ª a 3ª), Papéis avulsos e outros rabiscos do Autor.

— Textos e anotações avulsas (Curso de Pós-Graduação) do autor que devem ser consideradas circunstâncias imparciais.