Haikai / Haibun

Ontem cedo, antes das nove, parecia ter dois ou mais sóis para mim, a sensação térmica era horrível, sentia-me como que preso em uma grande estufa com poucas alternativas para uma melhorada na ambientação.

 

Foi aí que tive uma ideia. Eu estava em casa e, bem próximo dali, tem o espaço do Parque Ecológico Eldorado, que, embora não seja muito extenso, a sua maior parte é arborizada, então, não tive dúvidas em me deslocar para lá e dar um passeio pela trilha ecológica suspensa, feita de madeira, sob aquele arvoredo em que os galhos se entrelaçam, e, concomitantemente, ouvir o chilreio das aves e o som das lentas águas que fluem de uma nascente.

 

Passados menos de cinco minutos eu já estava lá a caminhar, ao longo da trilha deparei-me com uma pequena represa, onde avistei nas águas turvas algumas coloridas escarpas, uma gorda traíra, três ou quatro cágados e, pelo borbulhar constante por mim observado, suponho que outras espécimes vivam ali.

 

O clima, de fato, pareceu-me bem mais ameno naquele ambiente, minha vontade era de sentar-me em uma das sacadas da trilha e deixar o tempo passar sem preocupações com o que haveria de acontecer à medida que o dia fosse avançando em sua inexorável marcha. Pois bem, assim fiz, e, ao olhar de soslaio enquanto curtia o momento, identifiquei como que dois olhos sonolentos sobre uma rodilha verde numa forquilha da vegetação bem à minha frente, tratava-se de uma cobra cipó, que, provavelmente, buscava também usufruir do frescor daquela mata.

 

Ela não se moveu, embora não possua um aspecto dos mais amigáveis, pareceu-me que não se incomodava com a minha presença. Levantei-me vagarosamente, a fim de não perturbá-la, saquei do meu celular, abri o aplicativo da câmera e captei algumas imagens daquela rodilha viva, e, imediatamente, retornei para casa, deixando-a em paz.

 

/////

 

verão tórrido -

na sombra das árvores

cobra à espreita

 

[Imagens de Ana Cristina/Helbert].