MEU PAI

Há gênios que se assemelham às quedas d’água: sua

poderosa energia permanece inaproveitada, até que, por iniciativa própria, começam a projetar-se com maior intensidade, buscando ampliar sua força criadora. Foi assim o professor JOSÉ EDUARDO MOREIRA DA SILVA,ou melhor, o Professor Totoque.

Diamantinense cem por cento, trouxe consigo,de Diamantina o temperamento alegre, a ânsia de viver, o gosto pela música. Filho de pianista, demonstrou cedo inclinação pela arte, dedicando-se ao piano como professor, ao saxofone por diletantismo, e ao violino como seu grande amor.

Desde cedo radicado em Itabira, sua terra por adoção e que amava como se sua fosse, foi também professor de piano em Diamantina onde preparava alunos para o Conservatório Mineiro de Música. Dentre os muitos aos quais ensinou, vários nomes se destacaram e se projetaram no campo artístico. Professor também responsável pela Cadeira de Música da Escola Normal Oficial de Diamantina, foi colocado em disponibilidade não remunerada quando do fechamento da mesma por questões políticas,e jamais reintegrado.

Fixou-se definitivamente em Itabira e, além de professor particular de piano, lecionava também no Ginásio Municipal. Foi, sem, dúvida, um bravo lutador pela causa da música em Itabira e sua participação teve decisiva inflluência na vida artística da Cidade. Foi por sua iniciativa que toda uma talentosa geração aprendeu a amar a música, armando-se no tempo de segura base técnica.

Quem o conheceu de perto, via logo tratar-se de autêntico artista. Temperamento alegre, misto de bondade e boemia, era às vezes incompreendido, dado o gênio fechado e comedido dos itabiranos...

Pequena e provinciana, Itabira não tinha condições de manter uma orquestra profissional, mas nem assim o artista desanimou.

Com esforço, amealhando instrumentistas aos poucos, conseguiu organizar uma pequena orquestra, cuja finalidade era meramente espiritual, propiciando momentos de arte à sociedade. Colaborava com o Colégio Nossa Senhora das Dores nas festas de fim de ano, ao qual ajudava desinteressadamente, julgando-se recompensado pelo êxito alcançado pelas promoções do educandário.

Dirigiu e ensaiou como mestre, a Banda Santa Cecília, e a todos componentes incentivava com seu entusiasmo, dinamismo e bom gosto.

Devotou toda sua vida à causa da arte e batalhou sem esmorecimento em prol da divulgação da música.

Foi um grande virtuose. Seu violino vibrava tão intensamente numa “Czardas” de Monti, num “Intermezzo” de Mascagni, quanto numa valse chorosa de Zequinha de Abreu, ou nas serestas pelas frias madrugadas. A música era para ele como o ar que respirava, que o alimentava, que o envolvia...

O diploma de sua arte foi sua sensibilidade tangível, sua alma boa e simples. À música consagrou sua existência de homem dotado de imensa boa vontade ,de ânimo resoluto ante qualquer dificuldade. Teve como predominância em sua personalidade o idealismo , o

sonho de ver criado em Itabira um Conservatório no qual as gerações futuras pudessem dedicar-se à arte maior e ao aproveitamento de talentos. Foi visionário, porém do sonho não realizado ficou somente a idéia para os novos, pois o artista permanece contemporâneo

de todas as gerações.

Foi assim meu PAI, incapaz da mais pequenina ofensa, alguém que nunca visou a glória sequer a procurou, mas que deu tudo de si à causa da arte como evolução da cultura de Itabira, terra que muito amou.

Abençoados aqueles que em sua passagem pelo mundo lançam raízes que se prolongam indefinidamente pelos tempos...

Linandre
Enviado por Linandre em 11/06/2009
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